Review Secreto: Clube da Luta (o livro, não o filme)

A primeira regra do review é: você sempre comenta sobre o review.

Um dia, cansado após uma longa caminhada para esfriar a cabeça e pensar  porque os problemas parecem ser a força motriz do mundo e que ele entrará em colapaso caso um dia alcance a completa paz, e resolvi parar em um dos dois shoppings da cidade. O mais antigo, aquele que tem mais lojas e menos banheiros. Cansado e faminto, resolvi que compraria um refrigerante e um biscoito pra enganar o estomago antes de chegar em casa e jantar. Fui até o Hyper Bompreço e tive a impressão que toda a sessão de biscoitos havia sido transformada na sessão de alimentos light, aqueles que custam três vezes o valor de sua versão “normal” entupida de felicidade disfarçada de gordura trans. Olhei para aquele pacote de biscoitos de baunilha com gotas de chocolate da Bauduco que costumavam custar R$3,00 o pacote com 3 e os vi por assustadores R$7,00. Fui até o caixa, peguei uma Sprite pequena de R$0,99 e fui embora indignado com os valores, esbravejando por dentro tal qual donas de casa e senhorinhas de cabelos brancos e óculos de armações grossas e com estampa de oncinha costumam fazer em voz alta.

Sou o biscoito superfaturado do Joe/Jack.

Fui até as americanas na esperança de achar algo mais em conta e que se encaixasse melhor dentro do que o barulho das moedas em minha carteira estava propondo. Peguei um wafer da Bauduco, não porque, ao contrário do que você possa estar imaginando ao ler o nome desta marca duas vezes nesse mesmo texto, fosse meu favorito. Peguei porque R$1,50 foi o mais barato eu encontrei. Por que as coisas nos shoppings custam tão mais caro? Ainda estão pagando o terreno onde ele foi erigido e as principais taxas recaem sobre os biscoitos.

Sou o wafer caro e sem sabor do Joe/Jack.

Após pegar aquele biscoito que se autodenominava “clássico” e “tradicional” com toda a pompa que os dizeres em dourado de sua embalagem permitia mas, ainda assim, pesava e tinha uma textura semelhante a uma barra de isopor, fui a sessão de DVDs e Blu Rays como sempre faço. Apesar de ter um aparelho Blu Ray, nunca compro os tais discos pois além de mais caros que os DVDs, não vejo lógica em comprar filmes quando tudo está perfeitamente ao seu alcance via internet. A Netflix praticamente matou a lógica por trás desses aparelhos. Antes de sair, fui até os livros. E foi aí que, ao lado de um livro de receitas do Padre Marcelo Rossi e um livro aleatório sobre o Pégaso (o cavalo mitológico, não o Cavaleiro do Zodíaco), vi Clube Da Luta com a etiqueta de R$ 4,99. Olhei incrédulo, peguei o livro e levei até aquelas máquinas onde se confere os preços. Indicava R$9,90, ainda um preço muito bom mas estava R$3,99 além do que me sobrara, dinheiro este destinado a pagar o ônibus.  Fui até a fila do caixa e enquanto apenas 3 dos 10 caixas funcionavam com a maior lentidão que conseguiam, o que gerava reclamações atrás de mim, resolvi voltar e pegar o livro para confirmar qual seria o valor real no caixa em si. Fui, peguei, voltei e chegou minha vez. Expliquei a situação ao quarto caixa que acabara de chegar e subira para a segunda posição de operadores já que outros dois saíram assim que ele chegou, ele passa o livro no leitor de códigos de barras e…dá R$9,90. Ele chama outra operadora, ela digita algo no computador e…pronto! R$ 4,99, uma ida pra casa a pé e muita alegria no coração. Só pra constar, o shopping  fica à uns 30 minutos de caminhada de minha casa através de uma rodovia cercada por natureza  em sua maioria, o que é uma caminhada até agradável que as vezes faço pra relaxar.

Chego em casa, olho pra o livro e penso “Ah, não vou ler ele agora. Tenho outras coisas na fila de espera e deve levar uma eternidade pra eu terminar esse livro” ainda pensando na experiência tediosa que tive com os dois livros anteriores que li que eram com temática sobrenatural e baseados em acontecimentos reais. A realidade as vezes consegue ser chata até quando tem elementos fantásticos inseridos nela. No entanto, abri o livro e vi que não tinha aquelas introduções chatas e pedantes de 4 ou 5 páginas que outros livros costumam ter escritos por pessoas que você nunca ouviu falar mas que AMARAM tal livro e já pensei “ponto a favor”. Resolvi ler as primeiras linhas da primeira página e…BAM! Estava preso pela escrita rápida e envolvente de Chuck Palahniuk e me senti muito bem vindo aquele universo tão familiar  graças ao filme de 1999, dirigido por David Fincher e estrelado por Edward Norton, Bradd Pitt e Helena Boham Carter . Não consegui largar o livro até 20 minutos atrás, quando finalmente o terminei.

Originalmente escrito  como uma saída para o tédio em uma tarde de trabalho em apenas 7 páginas, que acabariam se tornando o capítulo 6 do livro, Clube da Luta é aquele tipo de livro que te pega pela mão e diz “vem comigo e não solta por nada, pois a viagem vai ser vertiginosa e você não vai saber o que te atingiu depois de acabar”. Se você não viu o filme (coisa mais comum já que ele é mais conhecido que o livro), eis a sinopse básica:

O Narrador, que não tem seu nome citado em momento nenhum, tem uma vida relativamente comum. Um trabalho comum, um apartamento comum mobiliado com móveis comprados na IKEA comuns, uma insônia comum e uma sensação de cansaço durante o dia comum. Tudo isso está prestes a mudar quando ele conhece duas pessoas. A primeira é Marla Singer. Acontece que o Narrador achou uma terapia incomum para sua insônia: frequentar grupos de apoio para doenças que ele não possuía. Aquilo lhe trazia uma estanha paz interior. Mas tudo vai por água abaixo quando conhece Marla durante a reunião dos homens que haviam retirado os testículos para salvá-los do câncer. Obviamente Marla era uma farsante, mas a presença dela lá, com seu olhar acusador,  mostrava que ele era um farsante também e a verdade poderia vir a tona a qualquer momento. A segunda pessoa, e essa sim, vai mudar a vida do Narrador pra sempre, é Tyler Durden. Um cara aparentemente despreocupado quanto a bens materiais e seguir as regras impostas pela sociedade, um sujeito com uma vontade real de começar uma revolução. Ou seja, o total oposto do Narrador. A vida dos 3 vão tomar rumos no mínimo inacreditáveis quando o Narrador se unir a Tyler na criação do Clube da Luta, um lugar onde homens irão se reunir em prol de um objetivo único e simples: explorar a violência (quase) sem restrições, colocar para fora todas as suas frustrações em forma de socos, chutes, cotoveladas, joelhadas e o que mais a criatividade permitir. E, a partir daí, um caminho ainda mais insanamente grandioso irá se abrir…

As histórias do livro e do filme são quase idênticas e é preciso destacar a maneira genial e nojentamente fiel que David Fincher transpôs a obra para a telona. Como eu, assim como muita gente, viu o filme antes de ler o livro, é impossível não enxergar as interpretações icônicas de Edward Norton, Helena Boham Carter e, sobretudo, de Bradd Pitt como Tyler Durden. Destaco Pitt porque o personagem é o completo oposto do  galã perfeitinho pelo qual costuma ser retratado pela mídia e pelo qual as mulheres suspiram aos montes. Tyler Durden é podre, desbocado, violento e…genial! Mas esse personagem só foi tão bem interpretado por Pitt por que Chuck o criou tão bem!

Palahniuk é a revolta social de Joe/Jack. Ele consegue transpor em linhas todo o sentimento de revolta  e a completa falta de bom senso por trás de algumas regras e ditames impostos pela sociedade. Como esses ditames nos dizem o que fazer, como fazer mas nunca como se auto-realizar. Tyler Durden está ali, como seu porta voz, pra nos mostrar que somos conformistas correndo em nossas rodinhas de hamster sem parar pra pensar na possibilidade que podemos descer dela e caminhar de verdade. Mas temos medo demais de pisar no solo desconhecido e sem um rumo predefinido. O Narrador está ali pra ilustrar justamente o momento em que resolvemos dar esse passo pra fora da roda mas ainda temos todas as amarras presas tentando nos puxar pra trás. Marla está ali pra nos mostrar que sempre encontraremos apoio em quem nos ama de verdade, por mais arriscado e estranho que essas decisões possam parecer. E as vezes esse apoio vem na forma de numerosos impropérios.

Palahniuk é a simplicidade de Joe/ Jack. Seu texto não é chato, arrastado, idiota e desnecessariamente rebuscado e, Deus o abençoe, nada prolixo. O que deve ser dito, é dito sem rodeios, floreios ou tentativas imbecis de parecer acadêmico e mais inteligente do que deveria. A leitura é rápida, agradável e te faz querer esquecer o resto do mundo até que tenha devorado as 270 páginas, que acabam parecendo apenas 100 de tão rápidas que passam.

Palahniuk é o manual da anarquia de Joe/Jack. Sempre que uma receita, seja de sabão ou de explosivos, é dada você se põe a pensar duas coisas: 1- Como Palahniuk sabe tantas coisas sobre isso e 2- Será que dá mesmo pra fazer tudo isso?

Palahniuk é a curiosidade atiçada de Joe/Jack. Após terminar de ler clube da luta você vai, imediatamente, querer caçar todos os livros do sujeito de forma implacável e impiedosa. E já tenho um em vista para ser minha próxima leitura! Trata-se de Assombro, livro de onde se originou um conto que incomodou muita gente internet afora anos atrás chamado “Tripas”. Sério, procurem e morram de agonia. Aliás, obrigado menino Lucas Gonçalves (eterno Menino Justino para mim), pela dica ( e por me deixar angustiado pra conseguir logo esse livro).

Ah, e pra quem não está entendendo o porque de eu sempre escrever  “Joe/Jack” nos parágrafos acima, a questão é simples: Entre as diferenças que o livro e o filme tem, está justamente o nome que o narrador começa a se referir em algumas cenas e que algumas pessoas, erroneamente, acham ser o nome real do personagem. No filme é Jack, no livro é Joe.

Enfim, post gigante pra dizer o óbvio: LEIAM CLUBE DA LUTA! Corram para uma Americanas AGORA, talvez vocês o encontrem por R$ 4,99 ainda (o preço original na etiqueta abaixo era de R$39,99). Caso não achem, procurem internet afora que vocês ainda conseguem encontrar barato e, com sorte, a edição de luxo que vem com o roteiro do filme junto. Seja em que versão for, procurem, achem, comprem e leia. Tenham certeza de que não irão se arrepender. Sou a promessa de Joe/Jack.

Nota:10

PS: Assim que acabei de ler o livro fui ver se achava a HQ Clube da Luta 2, também escrita por Palahniuk. Li umas 4 ou 6 edições online e não achei nem bom nem ruim, mas dizem que dá uma bela cagada no final. Ainda assim, achei por R$10,00 no Mercado Livre e me pareceu um preço passável pra algo que vá detestar e ter apenas pra dizer “olha, eu tenho a continuação do livro”. Eu sou a teimosia esperançosa do Joe/Jack.