Review Matador: Nobody (Sem Spoilers)

Saul Goodman tá diferente…

O filme de ação trazendo um idoso revoltado desejando vingança porque a fila da lotérica não anda ou por causa das musicas dos jovens ou ainda porque não tem café não é nenhuma novidade. Dos anos 70 ao inicio dos nos 90 tínhamos Charles Broson atirando em tudo que se movia e não agradava seus cansados olhos, sua cara enrugada e seu portentoso bigode. Nesse mesmo período vimos Clint Eastwood se metamorfoseando diante das câmaras de um tio do churrasco muito puto a um idoso muito puto na série de filmes do tira linha dura Dirty Harry.

Charles Bronson aos 16anos ao lado de Chuck Norris. Sim, ele já nasceu velho.

Porém, só em 2008 o diretor Luc Besson, que já não queria mais dirigir mas só escrever filmes de ação non-stop, pensou “E se a gente fizesse um filme com o Steven Seagal idoso? Melhor ainda! E se a gente fizesse um filme com o Steven Seagal idoso…MAS SEM O STEVEN SEAGAL! E vou mais longe! E se a gente fizesse um filme com o Steven Seagal idoso mas sem o Steven Seagal e colocasse…UM ATOR DE VERDADE?”. E assim nasceu a franquia Busca Implacável com Liam Neeson interpretando um idoso que a cada novo filme demonstrava maiores problemas de locomoção chegando ao seu ápice no terceiro e ultimo onde ele usava um dublê até pra andar. Busca Implacável foi um divisor de águas no cinema de ação e fez Luc Besson iniciar um novo sub-gênero dentro do gênero de ação: Os filmes de ação com atores velhacos e em baixa em Hollywood. Com essa premissa nasceram filmes como Dupla Explosiva, com um John Travolta gordo e careca se pendurando em um poste pra dar golpes de kung fu; A Família, com Robert DeNiro sendo o pai de uma família de assassinos; 3 Dias Para Matar, com o Kevin Costner tentando desesperadamente chamar a atenção novamente; e O Franco Atirador, com o Sean Penn TRINCADASSO no whey e distribuindo mais bala que festa de Cosme e Damião. Esse ultimo não foi escrito por Besson mas foi dirigido por Pierre Morel, diretor de um porrilhão de filmes escritos por Besson e que seguiu a cartilha do “Idoso de Ação” direitinho aqui.

Mas outra coisa que Busca Implacável fez foi colocar o ator dramático que não tinha grande experiência com lutas pra descer a porrada de forma convincente (quer dizer, só no primeiro…no segundo tem corte pra porra pra esconder dublê e no terceiro eu ainda acho que usaram um fantoche e o Liam Neeson só colocou a voz em pós-produção). E isso foi sendo repetido a exaustão em tantos outros filmes, e a galera precisava inovar a fórmula novamente. E foi aí que surgiu o primeiro John Wick (no Brasil ficou como “De Volta ao Jogo” fazendo muita gente achar que no Amazon Prime só tem o 2 e o 3 porque o primeiro não se chama John Wick), trazendo não apenas o ator sem muita experiência nos filmes de ação mas o colocando pra fazer cenas longas e sem cortes mostrando que era o próprio sujeito quem estava diante das câmeras. Certo que Keanu Reeves tecnicamente não é nenhum estranho pras artes marciais. O ator pegou um amor imenso pela arte oriental milenar de distribuir porrada enquanto treinava pra Matrix e se meteu em alguns outros filmes com a temática, chegando inclusive a dirigir um deles, mais precisamente O Homem do Tai Chi, onde também atuou como vilão. Mas em John Wick o sujeito elevou o nível. Isso sem mencionar que o diretor Chad Stahelski é um dublê, e se você ver qualquer cena de making dos dublês filmando as cenas de ação antes de mostrar pros diretores dos filmes, os caras fazem coisas incríveis que no próprio filme não chegam a metade do nível de beleza plástica. Com um dublê na direção e um ator dedicado, John Wick mudou tudo isso. Ah, curiosidade inútil: Chad Stahelski foi o cara que fez todas as cenas do filme O Corvo que não estavam finalizadas por conta da morte prematura do ator Brandon Lee, Uma dessas cenas, aliás, foi a pioneira em recriar o rosto do ator em CGI pra sobrepor o do dublê, técnica tão comum hoje em dia. É a cena onde vemos o rosto de Eric Draven maquiado pela primeira vez, e a técnica causou alvoroço na époica, como mostra a reportagem de 1993 que vou deixar mais abaixo. . Tem nada a ver com post, mas O Corvo é um de meus filme favoritos E O POST É MEU, EU ESCREVO O QUE EU QUISER! PITOCAS!

“Cacete, Hellboha…tu falou isso tudo e até agora e nem sequer citou o filme que dá título a essa bíblia que tu chama de post!” você deve estar protestando, jovem leitor e jovem leitorete. Eu quis dar esse panorama geral pra dizer que Nobody (ou “Anônimo”, como será chamado no Brasil) dá mais um passo além e une o idoso puto, o ator velhaco que não faz filme de ação fazendo filme de ação e o ator que não sabe dar um cascudo destruindo nas artes marciais em cenas sem cortes nem dublê! E, olha, eu acho que nem eu nem ninguém esperava ver justamente o Bob Odenkirk fazendo tudo isso…

Antes de mais nada, uma pequena sinopse:

Hutch Manssel é, aparentemente, um cara comum. Pai de família com um casamento morno, desrespeitado pelo filho adolescente, amado pela filha caçula e que tem dias tortuosamente rotineiros. Até que um dia sua casa é assaltada por um casal e seu filho reage e se atraca com um dos assaltantes. Quando ia aproveitar pra atacar a moça criminosa que estava em desespero por ver seu parceiro em luta corporal com o filho de Hutch, ele desiste e deixa os dois fugirem. Isso deixa seu filho ainda mais revoltado com ele e Hutch vira piada na vizinhaça. Hutch não liga muito pra isso, ou pelo menos finge não ligar, até que sua filha pequena revela que uma pulseira de gatinhos que ela adorava foi levada pelos assaltantes. Isso é a gota d’água pra Hutch, ou pelo menos a desculpa que ele queria pra revidar.

Ele acha o lugar onde o casal mora e quando estava pra se vingar, descobre que eles também são uma família com um bebê pra criar. Hutch desiste e sai frustrado. Mas as coisas mudam quando, na volta pra casa, um grupo de playboys arruaceiros invande o ônibus em que ele estava e começam a importunar uma moça. Agora sim, é a desculpa que Hutch queria pra extravasar as frustrações. Ele mete o sarrafo em todo mundo e manda alguns pro hospital. O problema e que um dos moleques, que fica gravemente ferido, é irmão de um mafioso russo que agora quer vingança contra Hutch. O que o mafioso russo não sabe é que Hutch não é um pai de família comum como aparenta…

Sim, a história tem certas semelhanças com John Wick, começando com o cara que vive uma vida pacata mas esconde um passado sombrio e tem habilidades mortais passando pelo motivo “pequeno” mas que tem todo um background emocional por trás que leva a uma grande vingança culminando com a mafia Russa. E essas semelhanças não são mera coincidência, já que o roteirista do longa, Derek Kolstad, é o mesmo da franquia John Wick. Mas apesar de todas essas semelhanças, o filme tem elementos muito próprios e muito bacanas.

O primeiro elemento a se destacar está no fato de que Hutch, apesar das habilidades que o tornaram famoso no passado, está parado a muito tempo e enferrujou um pouco. E é justamente por isso que ele não é uma máquina de dar porrada invencível desde o inicio do filme. Na luta do ônibus ele bate mas apanha na mesma medida, deixando esse aspecto de “Faz tempo que não faço isso” muito evidente e isso é GENIAL! Com o passar do filme ele vai ficando mais “habilidoso” porque é como se ele fosse “esquentando” a cada novo confronto e “ativando uma memória muscular” , por assim dizer. Ah, mais uma curiosidade inútil: Na cena do ônibus é divertido observar o elenco de “ilustres dublês”, pois muitos deles já foram protagonistas de filmes de ação B. Os que saltam aos olhos de imediato são Daniel Bernhardt, que substitui Van Damme nas TRÊS sequências de O Grande Dragão Branco e era o Siro na série de TV Mortal Kombat: A Conquista; e Alain Moussi que estrelou o remake de Kickboxer (que é melhor que o original) e sua continuação (que é um dos piores filmes já feitos na história da humanidade mas preveu o Ronaldinho Gaúcho preso) além de protagonizar o HORRENDO Jiu Jitsu, que de bom só tem o Nicolas Cage.

O segundo são os personagens coadjuvantes que são uma surpresa e geram uma quebra de expectativa MARAVILHOSA! Nesse ponto se destaca Christopher Lloyd no papel do pai de Hutch que vive num asilo. Em certo ponto do filme você pensa “Eita, vão matar o velhinho e aí sim, ele vai pra vingança pra valer” mas…não é bem isso que acontece. Não vou contar porque o post não tem spoilers, mas o que acontece É LINDO!

Bob Odenkirk está ANIMAL em suas cenas de ação e o sujeito se mostrou uma grata surpresa. Seu personagem não tem aquele jeitão pastel que normalmente seus personagens tem. Seu Hutch pai de família é meio amargo e triste, já seu Nobody, por assim dizer, tem uma expressão sombria e um ar de “eu posso te dobrar no meio se eu quiser. É isso que temos quando colocamos um ator talentoso em um filme de ação onde ele se dedica: Satisfação do fã de ação! E o sujeito se dedicou COM FORÇA, já que passou UM ANO treinando pro filme. O sujeito tá em ótima forma em seus 58 aninhos!

O filme faz meio que uma escalada de um tom mais de humor pra algo mais sombrio e violento do meio pro final. Isso não me incomodou, eu achei uma escalada gradativa e agradável, mas pode ser que muita gente estranhe. Fato é que a cena final do filme tem um momento “Esqueceram de Mim” tal qual Rambo: Last Blood, com a diferença de que aqui ficou sensacional gerando uma cena de ação gigantesca e non-stop. A cereja do bolo vem com o destino final do vilão, num misto de anti-climax, pois não temos um combate corpo ou cheio de falação com o vilão e, ao mesmo tempo, com o melhor clímax possível, já que tem uma solução tão inventiva quanto deliciosamente absurda e grosseira. Sério, eu ri alto com essa cena de tão maravilhosa.

Enfim, Nobody é um filme de ação que é uma grata surpresa, tanto por repetir uma fórmula de maneira eficiente a ponto de você não se incomodar e se divertir, quanto pelo fato de ter um protagonista tão inesperado que entrega um resultado incrível. Uma pena a galera do Brasil precisar esperar até 26 de março pra conferir. Mas assim que pintar em serviços de stremaing (acho que cinema não rola por aqui), corra pra ver sem medo!

Nota: 8,5

PS: Eu postei isso na página do Superamiches do Facebook, mas vale postar aqui de novo. Uma imagem que não me saia da cabeça enquanto eu via o filme foi essa que precisei parar e fazer.

PS 2: Com essa onda de universos compartilhados, eu ADORARIA ver um crossover entre John Wick e nobody. O que facilitaria é o fato de ambos os filmes terem boa parte da mesma equipe envolvidas em ambas as produções. E com o passado de Hutch Manssel, seria fácil colocá-lo como um ex-antagonista de John Wick.