QUADRINHOS (BARATOS) QUE LI RECENTEMENTE: PARTE 6
Esse é um daqueles casos do “sempre quis ter mas tinha preguiça de comprar”.
A HQ em questão é Superman/ Batman: Os Melhores do Mundo, escrita por Dave Gibbons, o desenhista de Watchman testando seus dotes como roteirista, e com arte de Steve Rude. A história já havia sido publicada em 1991 pela editora Abril em uma mini-série em 3 partes e que, ainda no mesmo ano, lançou uma versão encadernada. Depois foi republicada, também em três partes, pela Mythos em 2003. E em 2017 a Panini voltar a publicar a história, mas que dessa vez em capa dura, só que custando salgados R$32,90.
Fiquei muito tentado a comprar na época, mas gastar 32 contos em um gibizinho gerava a preguiça que citei no começo do post. E a minha vontade de comprar advinha única e exclusivamente da arte do senhor Steve Rude, cujo traço vi nas internets da vida e automaticamente cai de amores pelo seu estilo. Só que aí fui dar uma lida no primeiro número online e o que o traço do Rude tinha de atrativo o roteiro do Gibbons ia na direção completamente oposta…
Mas eis que surge o stand de shopping para minha alegria e lá estava a edição da Panini por apenas 15 Kryptonitas. Um preço que me parecia MUITO MAIS aceitável a ser pagar por algo que não parecia grandes coisas numa primeira leitura. Mas eis que li a edição completa e, bem…vamos a uma breve sinopse antes de mais nada.
Superman cuida de suas tretas envolvendo Lex Luthor em Metropolis, como sempre, e Batman cuida de suas tretas envolvendo o Coringa em Gotham, como sempre. Só que um dia Coringa e Lex Luthor resolvem tentar algo novo, eles decidem trocar de cidade pra ver se alguma coisa muda. Agora ambos irão tramar contra os heróis locais da cidade um do outro em uma trama que envolve orfanatos, especulação imobiliária e máquinas de demolição ultra-tecnológicas. Pareceu uma sinopse muito simplória? Pois é…é que FOI MESMO!
Seguinte…vou ser bem sincero… em determinado momento da trama eu já estava lendo no modo automático, sabe como é? Quando você lê uma frase mas sua cabeça não está processando nem armazenando NADA do que você leu! E sabe por que? Porque o roteiro do Dave Gibbons se arrasta DEMAIS em muitos momentos e fica bobo em excesso em tantos outros! Lendo os extras da edição fica claro a intenção de Gibbons de escrever uma história mais simples, nos moldes da Era de Ouro mesmo. E você também vê que o sujeito foi meio que influenciado por Alan Moore durante sua parceria na produção de Watchmen, já que Gibbons entupia o roteiro de observações detalhadas de como as páginas desenhadas por Rude deveriam ser. O problema é que Gibbons se foca tanto na trama de um orfanato que está para ser comprado por Lex Luthor com a ajuda do Coringa que acaba lembrando Star Wars Episódio 1: A Ameaça Fantasma, onde uma trama politica acaba tomando o espaço reservado para a aventura, que era marca registrada dos filmes da trilogia clássica. E pra fechar com chave de fezes, o cara me mete um terceiro vilão além de Lex Luthor e do Coringa, que acaba indo contra a intenção de surpreender o leitor e acaba se concluindo muito antes do fim da trama, fazendo você se perguntar se o Gibbons não tinha perdido a deixa pra acabar a história logo ali.
Mas, como eu já disse antes, se o roteiro não acerta o alvo, a arte tem a precisão de um sniper! Steve Rude faz folhear cada página se tornar um prazer. Como a intenção de Gibbons era fazer algo no estilo da Era de Ouro, Rude teve a brilhante ideia de se inspirar em um dos produtos mais geniais lançados nessa época, o desenho animado dos anos 40 do Superman produzido pelos irmãos Fleischer . E se você não assistiu a essa perola da animação, PARE TUDO QUE ESTIVER FAZENDO E VÁ VER AGORA MESMO! Ignore seu chefe gritando com você por sair no meio do trabalho ou por ter parado o que estava fazendo pra pesquisar pelos episódios na internet, isso é muito mais importante que seu emprego!
https://www.youtube.com/watch?v=XgKIb0BnXN8
Steve Rude capta todo o tom da animação dos Fleischer, seja em seus cenários com visual art deco, onde ele faz questão de deixar claro a diferença de tons entre Metropolis e Gotham em belíssimos painéis, seja no desenho de seus personagens, com o Superman sempre aparecendo em cenas claras e o Batman em cenas mais escuras. É como ver um lindo storyboard de um longa animado jamais produzido baseado na animação dos anos 40 mas com um visual atualizado para os anos 80. Seu Clark Kent/Superman é uma mescla do Superman da série dos Fleischer com os desenhos originais de Joe Shuster. No caso do Batman, a sua intenção era fazê-lo com o uniforme original das primeiras histórias, com as luvas custas e roxas, a capa mais aberta como asas de morcego e a máscara com orelhas mais largas, só que Dave Gibbons achou que o publico mais jovem não entenderia/aceitaria o personagem com um visual tão diferente do que o tornou icônico. E é aí que surge uma pequena curiosidade.
Vendo os desenhos de Rude você automaticamente faz a ponte com o Batman da série animada desenhando por Bruce Timm. O visual limpo, os olhos representados como dois simples triângulos brancos, o comportamento…TUDO remete a série animada do personagem. Com isso você pode pensar que se o Superman foi baseado na série dos irmãos Fleischer, então o Batman foi baseado na série do Bruce Timm, certo? Errado!
Acontece que a HQ foi lançada originalmente em 1990 enquanto Batman: The Animated Series só foi lançada em 1992! Logo, o Batman de Steve Rude pode ser considerada uma versão do morcegão caso ganhasse uma animação pelos irmãos Fleischer (o que certamente teria sido INCRÍVEL). E, segundo Bruce Timm, sua série animada também foi baseada na série dos irmãos Fleischer, e isso te faz pensar…teria Bruce Timm usado o design do Batman de Steve Rude como modelo para sua versão do personagem? Jamais saberemos! Ou talvez saberemos, é só perguntar por Bruce Timm. Bruce, me liga!
Bem, Superman/Batman: Os Melhores do Mundo é uma HQ que não tem um roteiro horroroso, só não é muito inventivo nem transparece ser meticulosamente tão elaborado quanto os extras mostram que Dave Gibbons queria que fosse. Pode agradar mais quem gosta daquela pegada mais inocente e até meio bobinha dos anos 30 a 60, mas pode soar meio cansativa para quem não é tão chegado assim (como é o meu caso). Mas, ainda assim, vale pela arte de Steve Rude que é uma aula de narrativa e dinamismo. Suas páginas nunca são monótonas e sempre tem algo acontecendo ao fundo. Sem falar que dá pra emoldurar muitas das suas páginas e artes promocionais para a série.
Então, encontrou no stand do shopping? Pegue sem medo!
Nota do roteiro: 6,5
Nota da arte: 10