QUADRINHOS (BARATOS) QUE LI RECENTEMENTE: PARTE 25

Eu NUNCA imaginei que um quadrinho da Image dos anos 90 iria figurar nesse post!

Eu ADORO a arte do Barry Windsor-Smith. Infelizmente, os trabalhos do sujeito lançados aqui no Brasil se concentram mais em títulos antigos do Conan, ainda com aquele traço inicial meio esquisitinho e BEEEEM diferente do que o tornou famoso pra muitos (inclusive pra mim) quando começou a experimentar em sua obra prima, Arma X. Fora Conan, ele teve seus trabalhos publicados no Brasil a conta gotas, em títulos como Superaventuras Marvel. Hulk e X-Men, Muitas vezes apenas como capista ou responsável pelo layout das páginas,que seriam desenhadas por outras pessoas.

Hellspont, vilão dos Wildcats no traço de BWS.

Em contraponto, eu não poderia CAGAR E ANDAR mais pros personagens da Wildstorm dos anos 90. Caso você não saiba o que é a Wildstorm, é a editora que o Jim Lee criou dentro da Image Comics. A ideia da Image é que cada autor tivesse sua própria editora, com seus próprios personagens e que a Image fosse a casa de todas. Mas isso, 99% de quem está lendo esse post já sabe. Enfim, NADA da Wildstorm me atraiu nem nos anos 90, quando eu lia muita porcaria (mais por falta de opção,pois foi a pior das épocas dos quadrinhos de super-heróis). Lembro que um amigo me emprestou um número de Wildcats (e, sim, eu sei que se escrever “WildC.A.T.S” mas não tenho saco pra ficar escrevendo sigla) e me pareceu um X-Men piorado. Lembro que vi um episódio do desenho na Record e também achei um desenho dos X-Men piorado (e olhe que, apesar da fama que goza até hoje, o desenho dos X-Men já era UM NOJO em qualidade de animação). E, sejamos honestos,Wildcats é exatamente isso, um X-Men da série C. O Espartano é o Ciclope, o Bandoleiro é o Gambit, a Devota é a Psylocke, a Lacuna é a cruza da Tempestade com a Lilandra e o Professor Xavier, Warblade é o Wolverine, Vodu é a Jean e o Marreta é…bem…o Hulk nunca foi dos X-Men, mas ele É o Hulk roxo! Mas se quisermos manter ele dentro da proposta de cópias dos X-Men, ele poderia muito bem ser o Colossus (que se lê/fala “côlossus” e não “cólóssus” como eu vejo muita gente pronunciar por aí e me dar uma dor na alma. O nome dele deriva da palavra colosso, simples assim).

Os Wildman…digo…os X-Cats…digo…cês entenderam!

Então o que diabos me faria comprar algo com os Wildcats na capa? Simples! Barry Windsor-Smith nos desenhos! E foi assim que acabei adquirindo as duas edições especiais de Wildcats: Tempestade de Fogo, por conta das capas desenhadas pelo BWS e porque ele também desenhava parte da história. Ah, isso e porque cada edição que você encontra sendo vendida entre R$10,00 e R$30,00 internet afora (como se realmente valessem isso…) me custaram R$3,00 cada.

A história é a mais básica possível: Milhares de anos atrás, duas raças que viviam em guerra, os Querubins e os Demonitas, caíram na Terra e continuaram sua guerra em nosso planetinha. Os Querubins são guerreiros com habilidades especiais e sua aparência é praticamente igual a nossa, com a diferença de terem cabelos brancos. Já os Demonitas…bem…eles são uma cópia descarada do Alien! Ah, e podem possuir corpos humanos e se passar por um de nós tranquilamente. Na Terra, eles são comandados pelo terrível Hellspont. Terrível nem tanto pela maldade, mas mais pela concepção, já que o personagem parece uma cruza vagabunda de Dormammu e Mystério, os vilões da Marvel.

Recentemente, foi descoberto que fragmentos de uma misteriosa chave estão espalhadas pelo mundo e que essa chave conseguiria reativar uma poderosa nave demonita que estaria perdida na Terra e teria poder não apenas de levar os demonitas de volta a seu lar como de destruir todo nosso planeta. Com Hellspont dado como morto em seu último confronto com os Wildcats, o vilão Profano (que parece ter fugido de um episódio de super super sentai) quer tomar todas as peças da chave e, ao invés de destruir nosso planeta e voltar para o dele, pretende transformar nossa terrinha em seu novo domínio. Pra impedir isso, não apenas os Wildcats mas todas as equipes e personagens da Wildstorm descaradamente copiados de personagens da Marvel (e alguns da DC) irão se unir num baita crossover de buchas em uma história mais básica que calcinha bege.

Sejamos honestos: Tirando Spawn, NENHUM OUTRO personagem da Image teve vida longa no Brasil. Seus títulos próprios duravam entre 12 e 15 edições (com exceção de The Darkness & Witchblade, que duraram admiráveis 25) e mais comumente apareciam em crossovers com outros personagens Marvel e DC (em sua maioria esmagadora, Marvel). Assim sendo, OBVIAMENTE que muita gente não iria fazer a mais parca ideia da cronologia da Wildstom pra entender os acontecimentos que levaram até os eventos mostrados em Tempestade de Fogo. E, sabendo disso (e pelo fato dos direitos de algumas publicações pertencerem a editora Globo), a Abril teve a gentileza de apresentar os personagens e equipes que aparecem na história nas 4 páginas iniciais de ambas as edições (apesar de eu achar que só precisava colocar na primeira edição, mas tudo bem…) e ainda reservar 7 páginas pra um resumão dos eventos que desembocaram em Tempestade de Fogo. Outra decisão inteligente da Abril foi, sabendo que Tempestade de Fogo era uma mega-saga que se espalhava por todos os títulos da Wildstorm, pegar apenas as páginas que serviam de prólogo pra saga em alguns títulos e usar como prólogos aqui e compilar todas as edições de todos os títulos da Wildstorm onde a saga se desenrolava em apenas duas edições especiais. O resultado é que você pode ler só as duas edições sem precisar de conhecimento prévio profundo de NENHUMA das cópias da Marv…COF,COF…digo…de nenhuma das super-equipes da Wildstorm e se divertir sem problemas! Ou não…já que é um gibi da Image dos anos 90, cheio de músculos, dentes rangentes e maiôs extremamente cavados servindo como uniformes femininos.

“Mas esse troço presta pra alguma coisa, tio Hellbolha?” você pergunta, incrédulo leitor e incrédula leitorete. Olha…vou te dizer que a história começa bem! Não é o pináculo das HQs de super-heróis dos anos 90,claro. O volume 1 tem vários pontos positivos, começando pela história dos Wildcats que dá o pontapé inicial pra coisa toda e que é desenhada pelo Barry Windsor-Nunes! Digo…Smith! A arte tá tão bonita quanto em Amra X? Não! É claramente um traço mais “simplificado”, com cara de “preciso cumprir o prazo” mas, ainda assim, é muito bonito! Sem falar que a história já mostra um confronto de superequipes, os Wildcats contra o Stormwatch. e foi a primeira vez que vi uma briga de duas superequipes dos anos 90 onde os personagens saíram estourados de verdade, com machucados sérios, ferimentos graves e precisando ser carregados pra fora da zona de conflito. Acredite, jovem leitor (a), hoje isso pode ser até comum, mas na época em que isso foi lançado, o ferimento mais grave que um personagem tinha num gibizinho pipocão era um fio de sangue escorrendo pela boca e andar torto com uma mão sobre as costelas.

Quebra pau febroso no traçode BWS

A próxima história segue agradando aos olhos com os desenhos de Travis Charest, um dos mais longevos desenhistas dos Wildcats e com um dos traços mais belos que já vi nas HQs. Esses sujeito é outro caso de artista foda com material escasso publicado no Brasil. Se querem uma recomendação, procurem o especial X-Men e Wildcats: A Era de Ouro onde ele desenha um crossover entre o Logan e a Devota durante a segunda guerra. A história pode não ser incrível, mas a arte…

Página dupla de Travis Charest.

Depois dessa história, os desenhistas que vem já são os mais clichês dos anos 90, como Jim Lee, Scott Campbell eWhilce Portacio. A surpresa fica por conta do capítulo final do volume 2,desenhando pelo kevin Maguire, da lendária Liga Cômica, e isso só torna ainda mais dificil levar a história a sério.

Arte de Kevin Maguire fechando a saga.

Mas, como eu disse, a história começa bem, não apenas pelos desenhistas que citei que desenham as duas primeiras partes. O roteiro, de um modo geral, parece tirado de um desenho animado de aventura dos anos 80/90, com o vilão em sua alcova ordenando seus capangas a irem pegar um artefato que ele precisa e cujo os heróis também estão atrás. Ele se desenvolve, dentro de suas limitações, de uma maneira até agradável, divertida e descompromissada, mesmo que essa COM TODA A CERTEZA não tenha sido a intenção de seus criadores que provavelmente queriam fazer algo grandioso. Só que, a medida em que ela vai passando, a qualidade vai de média pra “Meu Deus, os gibizinhos da Image eram muito ruins mesmo nos anos 90” com o final se resumindo a superequipes trocando sopapos com um vilão poderoso demais pra elas (mesmo já tendo sido derrotado por apenas uma dessas equipes no passado).

E com direito a explosão espacial e suposta morte de “heróis importantes”.

O volume 2 tem de destaque apenas a história que abre o encadernado, uma uma aventura do Deathblow, que é tipo um Justiceiro de R$1,99 da Image. Mas é dificil você esquecer que, de fato, não está lendo uma história do Justiceiro. De resto,o volume 2 tem os desenhistas mais “mamãe, quero ser Jim Lee” além da queda de qualidade já citadas. Mas é o volume 1 que trás a história mais destoante e cheia de coisas erradas de todas. E ela é estrelada para galera do Gen 13.

Nela, o vilão meia-boca Helmut é enviado pelo supervilão meia boca, Profano, para caçar Lych, mentor do Gen 13 e ex-integrante do Team 7, grupo de militares cujo um dos integrantes está em poder de uma das partes da chave, mas Profano não sabe exatamente qual. O Gen 13 está na praia, curtindo um dia de sol e a história dá vazão a garotas em biquínis minúsculos, poses sensuais desnecessárias, uma cena de uma das garotas assediando a outra gratuitamente seguido de uma cena de homofobia violenta. Ou seja, é o quadrinho perfeito pro nerd punheteiro que fica furioso quando as personagens de HQs e jogos aparecerem vestidas e com proporções de seres humanos normais, odeiam personagens gays ( e gays na vida real também) mas adoram ver duas mulheres “se pegando”. A história segue um tom mais cômico e poderia facilmente estar fora do encadernado já que não acrescenta merda nenhuma a já capenga história. Pra piorar, o design do vilão Helmut é claramente chupinhado de um robô que aparece em Dragon Ball,o qual, por sua vez,é uma homenagem ao Alien. O Pessoal da Image adorava o filme Alien, aparentemente…

Pra não ser injusto com o pessoal da Image, ele também pode ter sido copiado da terceira forma do Freeza em Dragon ball Z.

Porém os problemas também se estenderam a tradução da editora Abril. Feita pelo Estúdio Nankin, a tradução não é ruim em termos de erros de português, letras faltando nem nada disso, como é tão comum ver a Panini cometer. O grande problema é que a pessoa responsável pela tradução, em muitos momentos, traduziu algumas expressões ao pé da letra e muita coisa ou fica sem sentido ou acaba gerando momentos em que você se pergunta como deixaram aquilo passar. No campo das coisas sem sentido, em uma cena Lord Emp e Bandoleiro estão discutindo sobre fazer uma aliança com um vilão que torturou o Bandoleiro no passado. Emp diz pro Bandoleiro esquecer isso e ficar frio. No original Bandoleiro responde “Cool like that?” que poderia ser traduzido livremente como “Fácil assim?” mas a tradução da Abril acabou traduzindo como “Tá bom assim?”. Já no campo do “como deixaram isso passar?” na hora em que Helmut aparece para o Gen 13, e os personagens gritam um sonoro “HOLY SH***!” obviamente censurado o “palavrão”. No Brasil, poderiam ter traduzido como “EITA, PO***!” OU “AGORA FO***!” OU “FILHO DA PU***!” mas…não! Quem traduziu resolveu seguir o esquema da tradução literal e o resultado foi…bem…vejam vocês mesmos!

Imagem da edição original.
Versão brasileira.

Wildcats: Tempestade de Fogo é uma leitura completamente descartável e dispensável. Ainda assim, durante boa parte da leitura…me divertiu! Tanto pela história com pegada de filme ação fuleiro que só passa na Band ou na Record quanto pelo fato de ir reconhecendo de onde cada personagem tinha sido descaradamente copiado. Uma leitura que eu não indico a não ser que você seja um daqueles apaixonados pela Image dos anos 90 e acha que os quadrinhos atuais tem realísmo anatômico, coerência de roteiro, mulheres vestidas e respeitadas que não aparecem em poses apelativas gratuitamente mesmo quando estão claramente tristes e deprimidas e tramas relevantes demais. Aí pode ir atrás que é um prato cheio.

Nota: 6,0