Homem-Aranha: Tormento- Relendo e aprendendo…
Todd McFarlane foi um divisor de águas quando se trata do Homem-Aranha. Isso é FATO!
Antes dele, conhecíamos o Homem-Aranha nos traços anatomicamente corretos de John Romita Sr. e seus predecessores que seguiam a risca este estilo, modificando muito pouco com o passar do anos. Até que em 1988, um rapaz chamado Todd McFarlane, que queria ser jogador de baseball mas teve seus sonhos frustrados por um acidente, estreia nas páginas de Amazing Spider-Man 298 (Homem-Aranha 104 da Abril no Brasil). O rapaz tinha um estilo um pouco diferente, mas ainda se prendia aos desenhos anatomicamente corretos e traços limpos tão característicos dos títulos do Cabeça de Teia. E seguiu assim por duas edições, até que em Amazing Spider-Man 300 ele resolveu chutar o balde e soltar a coleira que prendia seu estilo. Foi assim que nasceu o Todd McFrlane que conhecemos hoje, com seu traço “sujo”, seu personagens com grandes olhos, suas anatomias “duvidosas” (pra não dizer TORTAS PARA UM CA$¨%*) e cartunescas, e que redefiniu não só o uniforme do Aranha, com a máscara ganhado olhos GIGANTES, como redefiniu o jeito como o herói se movia, sempre em poses anatomicamente impossíveis e mais “animalescas”.
No entanto, McFarlane estava relegado apenas a desenhar os roteiros “bobinhos” de David Michelinie.- Aliás, pausa aqui…os roteiros do Michelinie não eram apenas”bobinhos”, alguns era RUINS mesmo e pareciam ser escritos apenas pra o McFarlane ter o que desenhar e não cancelarem a revista! Voltando…- No entanto, isso pareceu mudar com a enorme popularidade alcançada por McFarlane, que tornou Amazing Spider-Man umas das HQs mais vendidas (se não A MAIS) de sua época. Foi quando, em 1990, a Marvel deu carta branca para que McFarlane escrevesse, desenhasse e arte-finalizasse a mini-série Homem-Aranha: Tormento!
Meu primeiro contato com Tormento se deu há uns 10 anos atrás, creio eu, quando vi na banca algumas edições de “Homem-Aranha: Grandes Desafios” da Panini sendo vendidas num pacote com uma edição de Avante Vingadores por R$4,99. Comprei as três disponíveis, quer eram “O Ataque de Venom”, “A Saga do Clone Original” ( dos anos 70, não aquela bosta dos anos 90) e, claro, “Tormento”. A edição “O Ataque de Venom” comprei pois já tinha lido em formatinho e adorava, e um amigo meu fez o “favor” de perder esse formatinho quando emprestei pra ele, aquele sacripantas. Já “A Saga do Clone” eu achei bem chatinha na época e talvez continue achando ainda hoje…mas preciso reler pra ter certeza. Mas foi “Tomento” que teve um impacto maior sobre mim, pois era uma história sombria, violenta, com um inimigo do Aranha matando e COMENDO pessoas de forma brutal enquanto ele era caçado por um vilão que se utilizava de magia e porções para cumprir seus objetivos e deixar o Homem-Aranha à beira da loucura! Sim…eu ainda não tinha lido a Última Caçada de Kraven nessa época. E, sim… McFalane safadamente usou a mesma trama.
Eis que resolvi reler Tormento pra ver se a história era mesmo tão boa quanto eu tinha achado naquela época. Pra minha surpresa, muitas de minhas impressões mudaram…mas não totalmente! Em primeiro lugar vamos analisar o McFarlane roteirista. Sim, ele quis fazer de Tormento uma espécie de “sequencia espiritual” de A Ultima Caçada de Kraven e fez um tipo de sequencia Hollywoodiana, onde pegam a mesma história do primeiro filme, aumentam a escala das coisas vistas nele e acrescentam novos elementos. O grande problema é que nem sempre isso dá certo no cinema e, com toda certeza, também não dá muito certo aqui. Se você conhece A Ultima Caçada de Kraven sabe que J.M. DeMatteis construiu uma história solida, perturbadora para os padrões do Aranha e, claro, icônica até hoje! E antes que alguém venha com “Ain, era pra ser uma história do Batman. Chupa Marvel”, saibam que a história original seria do Magnum (Wonder Man), personagem DA MARVEL.
O que McFarlane faz é “brincar” de escritor e, claramente, ele está tão influenciado pela história escrita pelo DeMatteis que se esquece de se distanciar da trama de A Ultima Caçada de Kraven. E se você estiver pensando “que nada a ver isso…essa história não era pra ser sequencia de nada”, lembre-se de que a vilã, cujo o nome se não me engano, o McFarlane se esquece de citar durante TODA A HISTÓRIA (fui pesquisar na internet e vi que é Calypso), tem como motivação a morte do Kraven “causada pelo Aranha”. Inclusive o Kraven faz uma participação sem um pedaço da cabeça na história. Que bonitinho…
McFarlane tenta passar uma sensação de perturbação em seu texto,principalmente quando o Aranha começa a alucinar após ser envenenado pelo Lagarto (aqui, fazendo das vezes do Rattus em A Ultima Caçada de Kraven). Aí temos as palavras “veneno” e “aranha” sempre aparecendo entre um balão recordatório e outro. Isso até que é um elemento narrativo interessante pra passar essa sensação de confusão mental, mas acaba ficando chato se usado demais, coisa que o McFarlane acaba por fazer. Outro elemento que ele usa, e aí eu já acho mais bacana, é colocar os recordatórios tortos quando o desnorteado Homem-Aranha se põe a pensar. O grande problema com isso é que as vezes os recordatórios se perdem em meio a bagunça das páginas, Mas disso falarei mais adiante.
Ainda sobre o texto, McFarlane tem alguns momentos em que ele tenta ser dramático e literário, e acaba escrevendo coisas…idiotas. Como quando ele resolve descrever os SENTIMENTOS DE UMA NUVEM DE FUMAÇA! Sim, ele o faz! E o texto é exatamente este:
Sim…a fumaça não apenas é pensante, como uma baita de uma esnobe…
E esse tipo de texto bobo se repete em muitos momentos. Mas não é só a falta de nexo textual que está presente. A falta de nexo em algumas situações também. A história se passa toda em uma única noite pra dar um ar de urgência e perigo. E, não bastasse ser espancado, arranhado, envenenado e o escambau, o Homem-Aranha precisaria passar por algo tão dramático quanto seu enterro em A Ultima Caçada de Kraven. Só que lá, ele passou duas semanas enterrado, aqui tem que ser algo que se passe em uma única noite, lembra? E McFarlane resolve que seria uma ótima ideia explodir a antiga casa do Kraven com o Homem-Aranha, o Lagarto e a Calypso dentro! JÊNIAU! A explosão é tão grande que a casa quase se desintegra, virando um amontoado de entulhos. Nem o Wolverine com o fator de cura overpower do universo Ultimate (que permitia sua cabeça continuar viva mesmo sem um corpo) conseguiria mantê-lo inteiro. Mas OS TRÊS NÃO APENAS SOBREVIVEM COMO QUASE NÃO SE FEREM! O Aranha continua reclamando mais do veneno no seu sistema do que da explosão quase nuclear que ocorreu á 2 metros dele e só conseguiu rasga sua máscara. McFarlane não tem noção de como o corpo humano reage a uma explosão bem debaixo de suas fuças…
Agora vamos a parte pela qual McFarlane foi imortalizado na industria dos quadrinhos: A ARTE!
Todd McFarlane é um caso estranho para mim (e talvez pra muita gente). Ele tem um traço torto, uma anatomia toda errada muitas vezes, faz uns desenhos esquisitos mas, ainda assim…eu gosto! E o sujeito não desenha torto por ser ruim e não saber o que está fazendo. Se você pegar as edições 298 e 299 de Amazing Spider-Man vai ver que o cara tem um traço todo corretinho, meio genérico até. Essa “estilização maluca” foi sua grande sacada e o que o destacou dos demais, pois era diferente de TUDO que se via nos anos 80 quando se falava em quadrinhos de super- heróis. Muita gente pode dizer “Ah, mas o Rob Liefeld também desenha tudo torto. E aí?” e eu digo que, ao contrário do Liefeld, o McFarlane sabia onde entortar, enquanto o “Mestre L” entorta por que NÃO SABE FAZER. Aliás, note que o McFarlane faz mãos, e mãos DINÂMICAS, mesmo que algumas saiam estanhas. Ah, e faz pés também. CHUPA, LIEFELD!
Mas vamos voltar a Tormento! Como eu já disse, McFarlane teve carta branca pra fazer a história do seu jeito, e o fez. Isso resultou em um narrativa que tem bons momentos e outros bem…estranhos. Em grande parte da história, McFarlane opta por deixar os tradicionais painéis (os quadrinhos da página) lidos de cima pra baixo e os substitui por finos painéis verticais que se dividem em até CINCO por página. ou seja, é como ler uma persiana. Isso até rende uns bons momentos como, por exemplo, quando ele quer mostrar algo pingando, seja a saliva do Lagarto sobre o rosto do Aranha ou o suor do Aranha sobre o rosto do Lagarto, revelando onde estava escondido. Mas as vezes ele bate demais nessa tecla e os seus desenhos “detalhados demais” acabam deixando essas páginas meio congestionadas.
Confesso que o termo “detalhado demais” é até elogioso, em se tratando da quantidade de elementos que o McFarlane joga nas páginas. O fato é que ele queria dar um ar sombrio a trama e tascou preto, hachuras e detalhes em profusão nas páginas, principalmente nas cenas em que o Aranha está em meio ao lixo, aos escombros e no covil da Calypso. Aliás, a própria Calypso tem um cabelo meio Maria Betânia, meio Caetano Veloso em plena Tropicália e com umas miçangas penduradas nele o que acaba deixando as cenas em que ela aparece em close uma bagunça ainda maior. Honestamente, a impressão que me deu ao olhar cada página foi a de que eu estava lendo um fanzine de um fã muito entusiasmado. Se bem que, a HQ é quase isso mesmo…
Pra finalizar a “parte técnica”, eu não posso reclamar muito da minha edição em capa mole e papel pisa-brite ( o mesmo dos formatinhos da Abril) já que só paguei R$4,99 por ela. Mas, na época (2007), mesmo com esse acabamento “baixa renda”, a edição custava absurdos R$14,90, o que era, SIM, muito caro pra usarem um papel tão vagabundo. E o pessoal que comprou nessa época não deve ter ficado muito feliz com a quantidade de erros gramaticais na tradução. Espero que tenham concertado esses erros na edição de 2013 e na edição dessa nova coleção do Homem-Aranha da Salvat, onde a história sairá no número 7.
Enfim, Tormento é uma história que eu adorei quando li pela primeira vez e, ao reler…eu ainda me diverti, apesar de todos os defeitos! Sim, ela está LONGE de ser um clássico, como muitos apontam por aí (beijo, Fernando Caruso) e até a própria Panini aponta nas suas chamadas sempre que a relança, mas é uma historia divertida de ser ler quando se tem um tempo livre e nada pra fazer. As loucuras do desenho do McFarlane rendem momentos esquisitos mas também rendem umas páginas bem bacanas! Recomendo? Até que sim, mas não se você estiver pensando em comprar a edição que vai sair na coleção da Salvat por 40 Termers Fujões. Você pode achar facilmente a edição que saiu na série Grandes Desafios (que é a que tenho) ou a edição de 2013 com capa cartonada e papel LWC por MUITO MENOS nos Mercados Livres da vida. Então, seja esperto e economize. Tormento não é uma tragédia completa mas também não é uma obra de arte que valha tanto.
Nota:7,0
PS: Vou aproveitar o andor e falar uma coisa com toda a honestidade do meu coração: Essa coleção da Salvat do Homem-Aranha tem uma pá de títulos que podem ser encontrados muito facilmente em encadernados mais baratos por aí, pois a Panini já lançou muitos deles antes. E, vamos ser sinceros, muitos desses títulos NÃO VALEM O PREÇO DA SALVAT! Sério, quando foi que você ponderou comprar “Homem-Aranha: Feroz”, uma história qualquer nota do Cabeça de Teia, por 40 conto? Essa mesma história saiu num encadernado de R$12,90 anos atrás e pode ser encontrado facilmente em sebos ou no Mercado Livre por preços entre R$12 e R$15. Só por que saiu em capa dura em uma coleção ela virou um clássico instantâneo? NÃO, NÉ, PORRA?! Ponham a cabeça no lugar molecada! Parem de bater palma pro fumo que está sendo empurrado no rabo de vocês só por que ele está embrulhado em uma camisinha escrita “de luxo” ou “coleção”. Vamos ser mais realistas!
Agora sim…até a próxima, amiguinhos!