Conan: As Três Filhas do Gigante de Gelo
Pera…TRÊS???
Se você é fã de Conan, provavelmente fez essa mesma pergunta! Calma que eu explico! Acontece que a editora Pipoca e Nanquim anunciou o lançamento de quatro encadernados compilando as histórias do Conan publicadas pela editora francesa Glénat. A Glénat não negociou os direitos das histórias do cimério publicadas pela Marvel nos anos 70 a 90 e nem da Dark Horse, publicadas no inicio dos anos 2000. Ao invés disso, a editora produziu remakes de histórias clássicas dando total liberdade para seus roteiristas e artistas para as interpretarem como bem entendessem, sem se preocupar com amarras cronológicas ou visuais. Cada um poderia desenhar o Conan como preferisse. Isso resultou em visuais bacanas, mas também resultou em visuais que não agradam muito aos olhos, como o Conan hipster de coque samurai que vai estampar a capa do volume 1 da Pipoca e Nanquim.
Antes de mais nada eu preciso avisar: Essa série de histórias não é uma maravilha! Na verdade, lá fora, onde já foi lançada, os reviews não são lá muito positivos! Eu dei uma olhada e algumas edições e devo concordar que, de fato, apenas uma ou outra história são boas, o resto é bem capenga. Falo isso pra que você, que é fã de Conan, dê uma olhada no material internet afora antes de gastar R$600 em quatro encadernados. A gente vive uma situação complicada, vê lá onde vai gastar teu dinheiro, criatura!
Isto posto, entre essas história da Glénat está uma que se sobressai VIOLENTAMENTE com relação as demais. Obviamente eu me refiro a adaptação de A Filha do Gigante de Gelo, aqui roteirizada e desenhada por Robin Recht. Mas ao invés de me concentrar apenas na versão idealizada por Recht, resolvi falar de todas as adaptações do conto de Robert E. Howard para os quadrinhos. Primeiro, darei uma sinopse base, que serve para todas as três versões produzidas, depois falarei de uma por uma fazendo uma pequena análise.
Sinopse:
Durante uma feroz batalha entre aesires e vanires nas terras gélidas de Nordheim, um jovem Conan, que havia se juntado aos aesires, acaba sendo o único sobrevivente em meio a mais de 80 cadáveres. Cansado, quase congelado e sentindo que estava a beira da morte, Conan ouve uma voz feminina e não acredita em seus olhos quando vislumbra uma jovem de pele alva, cabelos vermelhos e completamente nua em meio a imensidão gelada.
A jovem, que se nega a revelar sua identidade, começa a atiçar o jovem Conan que, adolescente e com os hormônios a flor da pele, acaba caindo na lábia da jovem misteriosa e começa a persegui-la. Caso a alcance, a jovem promete que se entregará ao cimério. O problema e que a jovem ruiva parece não cansar e nem se abater com o clima gélido, enquanto Conan luta com todas as forças pra vencer a neve pesada e os fortes ventos frios. O problema começa quando a jovem percebe que Conan não é um sujeito comum e, em pânico, chama seus dois irmãos para matar o cimério, pois sua “brincadeira” sai do controle. O “detalhe” é que os irmãos da jovem são…gigantes! Agora Conan vai ter que lutar pela sua vida contra algo que está além de sua compreensão.
As Versões:
1- Savage Tales Nº01
A primeira adaptação de A Filha do Gigante de Gelo foi publicada em Savage Tales Nº01 de 1971. A cargo do roteiro estava Roy Thomas, que teve uma longeva trajetória escrevendo Conan, e a arte ficou a cargo de Barry Windsor- Smith, que na época assinava apenas como “Barry Smith” e cujo traço é BEEEEEEEM diferente do que o tornou famoso em Arma X.
Savage Tales era uma revista destinada ao publico adulto por conter cenas de nudez, sexo e violência. Mas é aquelas, né…tudo ficava mais no campo da sugestão do que no do explicito. As mortes “violentas” aconteciam “off screen”, não se mostrava o personagem tomando uma estocada de espada e a presença de sangue era quase nula. A nudez também era encoberta, e no caso da bela Atali (sim, esse é o nome da ruivinha peladona), ela está sempre coberta pelo seu inseparável véu que o vento parece habilidosamente saber por sobre onde jogar.
A história é contada em apenas 12 páginas e culmina em Conan cometendo uma tentativa de estupro, que foi a unica parte que achei pesada de verdade. Mas é bem contadinha e, apesar do Conan do Barry Windsor-Smith parecer o jovem Sidney Magal marombado, seus desenhos são bacanas. Destaque pro fator que mais muda nas três versões, que são os irmãos de Atali, os gêmeos gigantes. Nessa versão eles são gigantes de uns 3 metros de altura mas com traços completamente humanos e cujo as vestimentas os fazem lembrar vikings.
Enfim, uma boa adaptação mas, certamente, a mais fraca das três.
Nota: 7,0
Essa versão foi publicada no Brasil nos seguintes títulos:
- Superaventuras Marvel Nº02 (Abril)
- A Espada Selvagem de Conan Nº 81 (Abril)
- Conan Saga Nº01 (Abril)
- Marvel Horror (Salvat Capa Preta extensão com histórias clássicas Nº21)
- Coleção A Espada Selvagem de Conan (Salvat em 2017 e Panini em 2019)
- Conan, O Bárbaro: A Era Marvel (Omnibus Panini)
2- Conan Nº02
Eu nunca fui grande fã do Conan. As histórias muito textuais e extremamente lentas escritas pelo Roy Thomas não me ajudavam a ler uma Espada Selvagem até o final (na verdade, tenho dificuldades até hoje, tendo em vista que algumas histórias prometem uma batalha ÉPICA…que é mostrada em apenas uma página NO FINAL DA PORRA DA REVISTA). Certo dia, vejo na banca um pacote com duas edições de Conan lançadas pela Mythos em promoção. Não lembro se era R$1,99, só lembro que estava nem barato e resolvi pegar. E foi aí que tudo mudou! As hist´órias escritas por Kurt Bursiek também tinham momentos muito textuais mas, ao contrário das histórias escritas por Thomas, tinha momentos de ação épica no meio e não apenas ao final, como era muito comum em A Espada Selvagem de Conan. E tudo magistralmente narrado visualmente pela arte colorida diretamente sobre o lápis de Cary Nord, artista que vez ou outra via em histórias do Wolverine nos anos 90.
As edições no pacote eram a Nº00, que mostrava um sacerdote lendo pergaminhos do passado sobre um tal cimério, e a Nº02 que trazia justamente a adaptação de A Filha do Gigante de Gelo.
Na versão de Bursiek e Nord a violência é mostrada sem remorso. A primeira página é uma panorâmica sobre a neve do campo de batalha com cabeças mutiladas ao chão, corpos com flechas e espadas fincadas em seus troncos e poças de sangue. Há uma luta entre Conan e o ultimo Vanir vivo que lembra demais a luta do Gutts contra o Bazuso em Berserk, não sei e foi intencional ou não.
Outra coisa bacana é o respeito a lógica que Nord tem ao desenhar Conan usando peles, já que ele está num local extremamente frio, e não apenas uma tanga de texugo como na versão de Thomas e Smith.
A história é contada em 22 páginas e se desenvolve melhor que a versão de Thomas e Smith, dando também mais dimensão a distância que Conan percorre enquanto persegue Atali. Aqui temos a mudança visual mais significativa com relação a versão de 1971. Os irmãos de Atali são representados como dois trolls gigantes, com uma altura entre os 5 e 6 metros e que ficam mais próximos do mito do abominável homem das neves.
A hist´ória termina de modo muito similiar a de 1971 mas com o adicional muito bem colocado de que os aesires que encontram Conan acham que tudo que ele descreveu foi fruto de uma alucinação proveniente da pancada que ele recebeu no elmo do ultimo Vanir que ele matou.
Essa história pode ser lida isoladamente mas o mais bacana da fase do Bursiek é que ele organizou os contos de Robert E. Howard e os adaptou de form cronológica, então você sabe como Conan acabou lutando na neve na edição Nº01 e o que aconteceu depois na edição Nº03, coisa que não acontecia na versão de 1971.
O Conan de Kurt Bursiek é sensacional e vale a conferida em TODO seu run! Se você nunca foi muito fã do Conan das HQs da Abril, dê uma chance a essa versão mais crua e dinâmica. Você pode se surpreender! Mas pra esse capítulo em especifico que é tema desse post, é…
NOTA: 8,5
Essa versão foi publicada no Brasil nos seguintes títulos:
- Conan, O Cimério Nº02 (Mythos)
- Conan, O Cimério Nº01 (encadernado em capa cartonada de 2005, Mythos)
- Conan: A Filha do Gigante de Gelo/ A Mercê dos Hiperbóreos (mesmo conteúdo do encadernado de 2005 só que agora em capa dura laçado em 2012, Mythos)
- Conan Omnibus Nº01 (Mythos)
3- Versão Glénat
Um dia, entediado e procurando algo diferente pra ler, eis que me deparo com essa HQ internet afora. Resolvi ver se alguém conseguiria fazer melhor que Kurt Bursiek e Cary Nord adaptando A Filha do Gigante de Gelo. Até então, pra mim, isso parecia algo impensável! Bem…errei rude, errei rude, errei feio…
Robin Recht, sozinho, conseguiu esse feito! Se a versão de Bursiek e Nord era violenta, a versão de Recht fazia ela parecer uma revista infanto-juvenil! A história já começa com uma cena de tortura seguida por uma cena onde lobos se alimentam do torturado. Os aesíres aqui são desenhados com visuais mais próximos do que seriam vikings reais, vestindo grossas camadas de pele, com logas barbas em seus rostos e elmos tipicamente vikings. Pra fazer um comparativo, o visual lembra muito algumas capas de Crônicas Saxônicas do Bernard Cornwell, só que mais dark.
Muitos são os pontos divergentes das adaptações anteriores e do conto original. Pra começar, temos o ponto de vista de Atali da batalha em que Conan está antes dela decidir se revelar pra ele. Ainda sobre Atali, enquanto nas versões de 1971 e 2003 a jovem tem suas partes pudendas censuradas pelo véu ou mesmo pelos seus cabelos ou é mostrada em nu frontal muito a distância onde fica lisa feito um manequim, na versão de Recht a coisa é MUUUUITO diferente! Atali não apenas aparece nua sem censura como faz questão de exibir seus atributos ao jovem Conan de maneira bem “desinibida”, atiçando o cimério com a sutileza de um elefante dançando balé! Inclusive, há uma cena inteira que demonstra que a semi-divindade é sádica pra porra quando Conan acaba caindo em um abismo e ela começa a se masturbar porque começa a sentir o medo de Conan a beira da morte! Sim, ela é doida!
Essa é a adaptação mais longa das três. Contada em 70 páginas, a história insere elementos pra deixar a trama mais dramática e cheia de ação. A batalha na neve é mostrada em sua totalidade, como eu bem disse, a perseguição a Atali é maior e mais dramática com a cena do abismo sendo adicionada e dando sequencia a uma cena sub-aquática que aumenta o tom sobrenatural da trama, temos a origem de Ymir sendo contada por Atali e, certamente, temos a mais selvagem versão de Conan apresentada. A fúria e a força de vontade nascida dela presentes em Conan assustam Atali de um jeito que as outras duas versões nem chegaram perto de mostrar.
Essa também é a versão onde o fantástico se mostra fantástico de verdade. Os irmãos de Atali aqui são representados por dois ursos polares gigantes que usam grandes presas de mastodonte como adorno nos ombros e centenas de crânios humanos em seus pescoços e peito. E essa também é a única das três versões onde Ymir se manifesta fisicamente e a cena é digna de um jogo da série God of War!
Enfim, acho que ficou claro que das três versões essa é, sem dúvida, a minha favorita! Esse é o Conan que eu sempre quis ver, sem franja tigelinha, sem tanga de texugo e, um detalhe que pode parecer bobagem mas, pra mim, fez toda a diferença é que esse Conan não é rasgado, como se tivesse uma academia ou um crossfit na Ciméria . Ele é forte mas cheio, tipo aqueles caras que puxam um caminhão por uma corda ou levantam um carro com as mãos nuas. Achei isso incrível e, ainda por cima, me identifiquei com o Conan “fordo” (“Forte+Gordo” pra quem não conhece o termo).
Pra versão de A Filha do Gigante de Gelo de Robin Recht eu dou…
NOTA: 10
Essa versão ainda não foi publicada no Brasil mas estará no primeiro volume de Conan, O Cimério do Pipoca e Nanquim que já está em pré-venda na Amazon.
Voltando a questão de se vale a pena pagar R$150 nesse encadernado. Olha, como eu disse, os reviews lá fora não são os mais positivos e pelo que eu mesmo vi, algumas histórias não vão agradar aos fãs mais hardcore de Conan, pois enquanto umas tem visual e roteiro maravilhosos, como a versão de Robin Retch, outras tem visual cartunesco demais e não casam com Conan, deixando-o mais com uma cara de Groo: O Errante.
Vá atrás de um scan antes! Sim, eu estou mandando você ir atrás de um scan! Não pra não comprar o encadernado do Pipoca e Nanquim, mas pra saber se vale mesmo a pena, porque as coisas não estão fáceis pra ninguém e é melhor saber se vale a pena antes de gastar do que se arrepender depois de gastar. Caso não se anime mas ainda queira ler algo bacana do Conan, procure o omnibus da Mythos, que é bem mais barato, vem com o dobro de páginas, além de colocar tudo em ordem cronológica começando o encadernado com o MARAVILHOSO arco Nascido em Campo de Batalha que conta a origem de Conan e tem a igualmente MARAVILHOSA arte de Greg Ruth pra, só então, entrar no arco MARAVILHOSAMENTE desenhado por Cary Nord. Falo sem medo de errar: Nesse run do Bursiek NÃO EXISTE UM ÚNICO CAPÍTULO RUIM! E tenho dito!
Bem, fica a dica! Espero que todos os 15 leitores que ainda leem meus posts tenham gostado! Faz tempo que não escrevo, tenho me sentido meio desmotivado por uma série de fatores. Mas espero que isso mude. Até a próxima!
PS: Essa fica mais como uma curiosidade. A série animada do Conan dos anos 90, aquele em que ele não matava e era mó gente fina e nada bárbaro, adaptou vários dos contos de uma maneira “family friendly”, com uma pegada bastante infantil, claro! Um desses episódios, mais especificamente o 46, adaptava justamente A Filha do Gigante de Gelo. Obviamente POUQUÍSSIMO tem a ver com a versão original. Mesmo assim, deixo o episódio abaixo pra quem quiser matar a curiosidade. Ah, está em inglês.