Ronin: A Nobre arte de rever conceitos.
Sabe aquele filme que você viu ou aquele livro ou quadrinho que você leu há uns 15 anos atrás e detestou?
Aí você decide rever ou reler, agora com a cabeça cheia de novos conceitos e ideias, com opiniões melhores formadas? Pois é, foi o que aconteceu comigo em relação a Ronin, considerado por muitos como a melhor obra autoral de Frank Miller. Mas a história de meu primeiro contato com Ronin é longínqua e eu explicarei agora.
Tudo começou quando, lá por meados de 2004, eu achei uma daquelas promoções de quadrinhos nas bancas do tipo “Leve 2 quadrinhos e pague só R$4,99”. Não lembro qual eram os outros quadrinhos, creio que fossem do Homem-Aranha, Ronin 2 e 3 vieram junto e eu não dei lá muita bola. No entanto, já havia visto muita gente rasgar seda sobre e resolvi ler, mesmo incompleta. Já sabia que a fonte de inspiração do Miller era o Lobo Solitário e as inscrições “O Primeiro Mangá Americano” na capa, apesar de soar forçada pra cacete,me chamaram a atenção. Li e lembro que achei a história confusa, chata, o traço não tinha porra nenhuma a ver com qualquer mangá com o qual eu já tinha tido contato e eu DETESTEI!
Anos se passaram e Ronin 2 e 3 ficaram guardados em um velho guarda roupas de meu antigo quarto. Foi quando, recentemente, foi anunciado o lançamento da edição definitiva, capa dura, com raios lasers e toda essa merda que encarece pra porra esses “encadernados de luxo”. Aí, pensei comigo mesmo “Agora que estou velho e com mais saco, será que não é a hora de reler, dessa vez DO INICIO pra ver se estou errado?”. Dei uma olhada net afora e encontrei o número 1 da Opera Graphica por um preço que pude pagar e (bem barato, aliás), após um período de espera que só os correios podem proporcionar, me pus a ler e, olha…meus conceitos realmente mudaram!
Ronin, caso você não conheça, narra a história de um jovem yojimbo (guarda costas) que acaba vendo seu mestre ser assassinado por um demônio chamado Agat, o qual reivindicava uma espada mistica que estava em poder do falecido oyabun do jovem samurai. Agora transformado em um ronin (nome dado aos samurais sem mestre), o jovem recebe a espada como herança e o espirito de seu mestre lhe diz que a espada matará Agat apenas quando banhada em sangue de um inocente. Após anos de batalha, o Ronin se sacrifica, usando seu próprio sangue como alimento para a espada afim de matar Agat. O plano funciona mas, antes de morrer, Agat condena o espirito do Ronin e o seu a serem um só e ficarem presos à espada até que alguém os liberta-se e o combate recomeçasse. E é o que ocorre no “distante” futuro de 2019.
O mundo virou um cabaré de xola e uma grande corporação no meio de Nova Iorque, chamada de Aquarius, está desenvolvendo uma liga cibernética inteligente unindo inteligência artificial e os poderes mentais de um rapaz deficiente chamado Billy. Enquanto isso, em um laboratório distante, a espada sagrada é encontrada e, ao tentarem fazer um experimento com lasers nela, a mesma explode e libertar tanto Agat quanto o Ronin. Agat, como o demônio que é, tem poder o suficiente para gerar um corpo, mas o Ronin precisa de um hospedeiro e usa as habilidades mentais de Billy como um condutor para chegar até seu corpo e tomá-lo. O campo de batalha está armado novamente, dessa vez no futuro.
A história de Ronin é muito bem trabalhada e, sim, um dos melhores trabalhos de Miller, devo concordar. No entanto, há muitos equívocos com relação a fama que a obra ganhou. Primeiramente, o tal “O Primeiro Mangá Americano” não só continua um exagero como se mostra algo completamente errôneo. Miller é fã confesso do Lobo Solitário, não à toa temos artes dele nas capas das edições do mangá lançados fora do Japão. O problema é que meter um samurai como protagonista, falar de cultura japonesa e coisas do gênero, NÃO TORNAM UM COMIC UM MANGÁ AUTOMATICAMENTE.
Ronin tem muito mais cara de um quadrinho europeu do que de um mangá. Ele FEDE a Moebius! “Ah, Hellbolha, mas e a narrativa cinematográfica? Isso é TOTALMENTE MANGÁ!” você pode dizer, e eu digo que os quadrinhos europeus também a tem, bem como os comics , só depende do talento do autor. A parte “mangá” que fica claro em Ronin são as inspirações de Lobo Solitário e Akira esparramadas por toda a história. Ah, e por falar em “cinematográfica”, temos 2001: Uma Odisseia no Espaço marcando presença nas referências também.
Quanto a arte, Miller estava solto. Com um estilo meio “rabiscado”, o traço de Miller lembra uma mescla de Cavaleiro das Trevas 1 e 2. E as similitudes de muitas situações com O Cavaleiro das Trevas 2 te faz pensar que, se fosse feito com paciência e boa vontade, esse seria o visual que a mal fadada continuação teria e, pelo menos, seria bonito visualmente.
Quanto a narrativa, não há o que se discutir: Miller em seu melhor! As composições de cena são sensacionais e até os longos diálogos (outro fator “nada mangá) ganham certa agilidade por conta disso.
Enfim, Ronin é uma das melhores obras autorais de Frank Miller (talvez seja a melhor, mas não lembro de ter lido outras) e, falando empiricamente, DEVE SER LIDO DO INICIO e não do segundo número em diante, como fez esta anta que vos escreve anos atrás. Agora, vale os R$92,00 reais que a Panini anda cobrando? Na minha opinião, nem essa NEM QUALQUER OUTRA HQ deveria custar tanto. Ninguém anda cagando dinheiro! Mas os fãs de quadrinhos parecem ter uma sanha de gastar dinheiro que não tem com coisas que não precisam só pela beleza…
Então, quer ler Ronin? Leia! Mas procure promoções. Quando um gibi custa quase o ( ou mesmo o EXATO) valor de uma cesta básica, algo anda muito errado…
Nota: 8,0
PS 1: Ronin foi lançado MUITO ANTES de Cavaleiro das Trevas, mas já podemos ver indícios da trama em Ronin, como gangues urbanas caricatas e até o protótipo da personagem nazista Bruno.
PS 2: Frank Miller tem o péssimo hábito de desenhar espadas feiosas e, não satisfeito, fazer os personagens dares golpes com as cotas da espada, como se elas tivessem fio.
PS 3: Samurai Jack TÃO MAIOR!!!