Shenmue: The Animation

Aquele anime feito com o troco do pão.

Em 1998 eu vi em uma revista que a Sega estava pra lançar pro Dreamcast um jogo bastante ousado para sua época. O plano original era contar a história de Akira Yuki, personagem principal de seu primeiro jogo em 3D, Virtua Fighter, lançado em 1993 pra Arcade e em seguida pro Sega Saturn. Por´ém, os planos mudaram e apesar do personagem principal ainda ser quase identico a Akira Yuki, agora o jogo seguiria seu próprio caminho, totalmente independente da franquia de luta. E assim começava a aventura de Ryo Hazuki pela cidade de Yokozuka em Shenmue.

Na trama, Ryo é um estudante e praticante do estilo de luta da família Hazuki, que é uma mescla de Jiu Jitsu e Karatê e cujo seu pai é o atual mestre. Um dia, Ryo vê seu pai ser assassinado por um misterioso homem com vestes chinesas que procurava um artefato chamado “Espelho da Fênix” que estava em poder do velho senhor Hazuki. Agora Ryo precisa buscar pistas de quem é esse misterioso homem, do que são esses mistiosos espelhos misticos e do passado de seu pai, que escondia um grande segredo.

A trama do jogo não tem nada de inovador ou mesmo de ousado, como citei no inicio do post. A parte “ousada” é que você, no controle de Ryo, teria que não apenas investigar mas também trabalhar, treinar novas tecnincas de artes marciais e viver o dia em “tempo real” (obviamente acelerado, claro) tendo que comer e dormir. Pra época isso era algo inovador, hoje é o mote básico de qualque jogo de mundo aberto, como GTA, por exemplo.

Fato é que eu fiquei maravilhado, tanto pelo visual (incrível, pra época), quanto pela possibilidade de ter uma vida num mundo virtual e ainda evoluir as habilidades marciais de seu lutador. O jogo saiu, fez certo sucesso (creio eu, não me informei bem sobre, mas sequencias demoraram ´SÉCULOS pra sair) mas eu não joguei porque era pra Dreamcast e eu não tinha dinheiro pra ter um (e na locadora só tinha um e quase nunca tava livre). Há uns cinco anos atrás, FINALMENTE, joguei o jogo via emulador. E foi uma das experiências mais DECEPCIONANTES que eu já tive! Acontece que eu esperava poder tocar o terror pela cidade, mas o jogo era civilizado demais e tinha os momentos certos pra porrada estancar, e isso só acontecia depois de longas missões menores, como trabalhar e ir pagar as contas na lotérica.

Mas eis que no finalzinho de 2021 foi anunciado o anime que adaptaria o jogo! O anime surgiu de uma parceria entre o Adult Swuin e a Crunchyroll e a primeira imagem já me causava certo incomodo. Ela tinha um ar das imagens promocionais daqueles animes vagabundos que a Marvel produziu em parceria com a Madhouse.

Pra mim, isso era sinal de visual genérico e animação pobre. E então veio o trailer….e meus temores se confirmaram!

Então, ontem, durante uma conversa com os amiches no grupo de Whatsapp, eu lembrei do anime e resolvi ver se já haviam lançado. Descobri que já haviam dois episódios disponíveis. Vi e este é o motivo de estar escrevendo esse post, claro!

A trama é a mesma do jogo que eu contei lá em cima, então não vale a pena me repetir. De diferente temos uma cenas do Ryo ajudando o grupo de Karatê da escola em um torneio antes da trama principal começar, só pra dar um background maior ao personagem. O que vale citar de positivo é a fidelidade ABSURDA ao jogo! O character design se apegou fortemente ao jogo, todo mundo tem exatamente o mesmo rosto dos jogos ( quando não exatamente, são muito p´roximos). A direção se preocupou em recriar as cenas mais importantes e até os confrontos menores com os mesmos angulos de câmera, os mesmos golpes e até os mesmos diálogos. Disso, o fã dos jogos não vai poder reclamar. Mas aí tem o problema maior da série pra mim…a qualidade da animação!

Animado pelo estúdio Telecom Animation Film, que tem muita coisa belíssimamente animada em seu curriculo, como os OVAs de Lupin III focados nos coadjuvantes Jigen e Goemon, e algumas coisas com uma animação mais “básica”, como Muteki Kanban Musumi, Shenmue: The Animation claramente caiu na categoria dessa segunda. Enquanto o charachter design se esforçou pra deixar os personagens identicos ao jogo, a equipe de animação parece ter economizado como deu na hora de desenhá-los. Eu não sei extamente como explicar, mas…digamos que os traços lembram aqueles desenhos de revista do tipo “Aprenda a Desenhar Mangá”, sabe? Não tem personalidade! Não tem diferencial! É tudo muito genérico!

E as vezes FEIO! Olha o tamanho da cabeça desse senhor com relação aos braços! Esse é o autêntico “Cabeça de Ancureta”.

Isso sem falar na animação dura, travada, algo que não deveria acontecer em um anime que tem artes marciais como tema central e que deveria ter a fluídez de movimentos como objetivo maior! Ironicamente, lá por volta de 2016, quando anunciaram que Baki ganharia um novo anime comemorando seus 25 anos, um vídeo promocional foi lançado com algumas das cenas da fase do mangá que seria adaptada dando uma breve resumida do que estaria por vir. O responsável pela animação desse vídeo foi e Telecom Animation Film e lá, apesar de abusar de cenas estáticas só com o movimento de câmera, se sairam bem melhor que em Shenmue (ah, e o anime que chegou a Netflix ficou a cargo da TMS, mesma esmpresa que animou Saint Seiya: The Lost Canvas).

Ela não é de todo ruim, já vi animes de luta com animações bem piores, mas vou deixar aqui 3 exemplos. O primeiro é a intro do jogo com a luta no dojo, o segundo é a mesma cena adaptada pro anime e o terceiro é a cena de luta no bar de Street Fighter II: Victory onde Guile varre o chão com o Ryu.

https://www.youtube.com/watch?v=qGkfVqEvdTs

Notaram como na adaptação cortaram movimetos e encurtaram a luta do pai do Ryo com o chinês do mal? Notaram em como os movimentos são um tanto duros na animação e a câmera é pouco dinâmica? E notaram como em Street Fighter II: Victory tem cena parada, tem close de punho e pé acertando a cara mas tudo dá a sensação de velocidade e peso? Isso sem falar na sonoplastia que também ajuda a aumentar essa sensação! E nos momentos em que o Guile mete a porrada no Ryu em plano aberto, não tem “nuvenzinha de fumaça” pra criar a ilusão de poder aos golpes. Você vê o suor voando e, vez ou outra, um raio acompanha o movimento do golpe só pra acentuar o quanto ele é perigoso! Sim, eu sou chato com animação de luta e foi justamente Street Fighter II: Victory que me tornou esse cri-cri! Claro que a série tem episódios com lutas lamentavelmente animadas, como a do Ken contra o Fei Long ou do Ryu contra o Sagat, mas todo anime tem aqueles episódios animados por aquele estúdio merda, não é mesmo?

Então isso quer dizer que eu detestei Shenmue: The Animation? Não! O pior é que eu gostei! Eu adoro animes sobre artes marciais sem poderzinhos e eles são ultra-raros! Dá pra contar nos dedos das mãos os existentes. E mesmo com a trama de filme americano de artes marciais B dos anos 80/90 (que os japoneses ADORAVAM por ser diferente de seus filmes de porradaria, não a toa Fatal Fury tem o mesmo plot base de Shenmue) uma animação básica nas lutas e dura e pobre no conjunto geral, eu acabei sendo pego por Shenmue pelo pé! Eu diria que é aquele “bom anime ruim” que eu vou ver religiosamente toda semana! Não creio que a animação vá melhorar mas pelo que eu vi dos trabalhos da Telecom Animation Film, também não vai ficar pior!

No final, Shenmue é aquele animezinho pra ver sem esperar muito, que diverte mas que poderia ter um tratamento melhor, sobretudo quando você lembra que o Adult Swim tem as animações de Black Dynamite e G.I. Joe Resolute em seu catálogo de originais e são bem melhores animados. Mas, ainda assim, vale a recomendação pra você ver em um momento de tédio ou se é fã da série de jogos.

Nota: 7,0

Hellbolha
15/02/2022