Review Diferente: O Pequeno Ninja Mangá.

Ultimamente eu só tenho feito post sobre mangás que não são mangás, né…!?

Quando eu era moleque eu tinha umas 3 edições do gibi do pequeno Ninja e uma do “spin off” surgido de suas páginas, Kihn: O Pequeno Samurai. Pra mim, aquelas revistas deviam ser um baita sucesso, pois o tema era ninja, o que era legal pra caramba, sobretudo em 1990 quando a TV era COALHADA de filmes de ninja, e porque no final das HQs tinha um anuncio pra você comprar a roupa do Pequeno Ninja via correios, e se tinha um produto desses a venda, só podia significar que O Pequeno Ninja era uma baita marca de sucesso. Certo?

Pequeno Ninja enfrente Kihn,antes desse ganhar revista própria.
A roupa que eu era MALUCO pra ter! Percebam o cupom pra se preencher com peso e altura pra roupa não vir do tamanho errado. Que confiável…

Errado! Recentemente, graças a internet que me lembrou que o personagem existe, fui dar uma pesquisada na duração das revistas esperando ver páginas e mais páginas do site Guia dos Quadrinhos cheias de capas de O Pequeno Ninja. No entanto,o que descobri, para meu total espanto, é que as revistas do Pequeno Ninja NUNCA passavam da sexta edição, sendo canceladas e lançadas sob novos título como, As Aventuras do Pequeno Ninja ou Almanaque do PequenoNinja ,mas sempre sem sucesso. Kihn: O Pequeno Samurai foi bem pior e só durou QUATRO edições.

Fonte: Guia dos Quadrinhos

“Mas por que diabos você lembrou do Pequeno Ninja 30 anos depois do seu lançamento, Hellbolha?” você pode estar se perguntando(e com razão). Acontece que certa feita, láááá por 2005 (acho…) eu encontrei na banca um pacotinho com 2 revistas por R$1,99 e o que me chamou a atenção era que se tratava de uma “atualização” do Pequeno Ninja. O traço era BEEEEM diferente do traço mais infantil do gibizinho original, muito mais agressivo e era intitulado “O Pequeno Ninja Mangá”. Movido pela nostalgia ( e pelo preço baixo), peguei o pacotinho sem esperar nada de mais. Li as duas edições, vi o que era a tal “atualização” (que já estava bem escancarada na capa) e deixei guardado em alguma caixa até dá-la a meu sobrinho tempos depois, quando ele ainda era uma criança e não um adolescente que vive postando fotos e vídeos fazendo cara de míope chupando limão no Instagram.

Eis as edições que vinham no pacotinho. As números 2 e 3.

E o Pequeno Ninja caiu de novo no meu esquecimento, até que semana passada, procurando algumas revistas da Mythos do inicio dos anos 2000 que quase ninguém leu internet afora, me deparei com um scan com a série O Pequeno Ninja Mangá completo e, tomado pelo completo tédio, resolvi baixar e ler, afinal mal não ia fazer (e scan é de graça). Ontem eu li este scan e aqui vão minhas impressões sobre esse mangá nacional que passou batido pra um monte de gente.

Antes, a sinopse (que peguei do blog RicAlexHQ pois tô com preguiça de resumir plot):

No início dos tempos Godam, o ser supremo, senhor do reino da luz criou todo o nosso universo. Mas um dia, Satoran, uma de suas criações, se rebelou e quis destruir seu criador e tomar-lhe o reinado. Satoram porém falhou e foi banido para o reino das trevas, onde se tornou a personificação do mal e o mais perigoso inimigo de Godam.

Quando criou o universo, Godam criou uma passagem interdimensional, um portal místico que serve de passagem para qualquer lugar do universo em qualquer dimensão. Temendo que o portal caísse em mãos erradas o ser supremo criou o dragão Yohs-Hagon, para proteger a passagem. Durante milhares de anos tudo ficou tranquilo até que Satoran descobriu a existência desse portal e por inúmeras vezes tentou, com seu exército, destruir Yohs-Hagon para conquistar a passagem e usa-la para invadir o reino da luz, mas todas as tentativas foram em vão.

Após alguns séculos um de seus espiões descobre que Yohs-Hagon precisa hibernar a cada 500 anos para repor suas energias, a partir daí Satoran passou a enviar um escolhido para tentar destruir o dragão durante o seu sono, e do outro lado Yohs-Hagon passou a escolher um guerreiro para defendê-lo. E desta vez o escolhido de Yohs-Hagon é ninguém menos que O Pequeno Ninja.

Eu não sei quase nada da história da produção do mangá, mas o que posso concluir pela página de créditos é que a ideia surgiu na escola de desenhos ESA : Escola Studio de Artes para colocar alguns de seus alunos formados (alguns já trabalhando como professores da escola) para trabalhar na produção de uma HQ pra valer (se bem que alguns já haviam trabalhado em outras HQs, mesmo que desconhecidas, como A Turma do Moercegon…seja lá o que isso tenha sido…). A editora responsável pelo lançamento em banca foi a Editora Cristal, que tem em seu “curriculo quadrinisto” pouquíssimas coisas, todas lançadas entre 2002 e 2004 e a maioria focada em…sexo! Com 2 títulos de hentai, diga-se de passagem…

A galera que trabalhou no mangá.
Títulos da Editora Cristal (Fonte: Guia dos Quadrinhos)

Agora, lembra da tal “atualização” que “já estava bem escancarada na capa” que eu citei lá em cima? Pois bem…em 2000 havia estreado Dragon Ball Z nas tardes da Band e era a febre entre a molecada. Então, na hora de transformar o Pequeno Ninja em mangá, o que os responsáveis fizeram? Exatamente! Emularam NA CARA DURA o traço de Dragon Ball Z! Se bem que tem muita coisa tirada diretamente da fase clássica de Dragon Ball, sobretudo as tiradas cômicas e até umas expressões desenhadas em “ctr+c, ctrl+v” que fica difícil não reconhecer na hora. vale lembrar que a primeira fase de Dragon Ball tinha tido pouco mais de 60 episódio exibidos pelo SBT em 1996 e a garotada nem sabia que existia, até a Globo exibir na íntegra alguns anos depois.

Normalmente eu critico com violência quem não desenvolve um estilo e, principalmente, quem emula a arte de terceiros em suas HQs e mangás autorais, mas aqui eu vou dar um desconto (bem forçosamente) ao Bruno Paiva, responsável pela arte. Acontece que em 2002 os mangás que tinhamos em banca eram Dragon Ball e Os Cavaleiros do Zodíaco pela Conrad e Samurai X (Rurouni Kenshin) e Sakura Card Captors pela JBC. O mangá ainda estava engatinhando como produto de consumo comum nas bancas e o maior referencial de anime de porradaria pra molecada da época era, de fato, Dragon Ball Z. Logo, como o mangá do Pequeno Ninja era direcionado ao público infanto-juvenil, foi decidido utilizar uma identidade visual mais facilmente reconhecível. É preciso lembrar que em 2002 o acesso a internet não era tão aberto como hoje em dia e a galerinha de 2 a 11 anos (que, caso você não saiba, é a faixa etária do publico infanto-juvenil) não tinha como saber quais mangás e animes estavam em alta no Japão e fora dele. Pra eles, só existia Dragon Ball Z e tudo que fosse minimamente parecido com aquilo era legal pra caralho! Uma coisa é você copiar um traço pra crianças reconhecerem em uma época onde a TV era a unica fonte de informação acessível pra todo mundo, outra é copiar One Piece e Naruto no século em que até monges tibetanos tem smartphone com internet e sabem quem são Eichiro Oda e Masashi Kishimoto.

Tá certo que as vezes a mão pesava na “referência”…

E a arte do Bruno paiva pode não ser uma Brastemp (todo mundo parece ter nanismo no universo do Pequeno Ninja desenhado por ele ), ele pode emular o traço do Akira Toriyama e até chupinhar algumas expressões faciais e situações, mas…dentro da proposta do gibizinho, ele se sai muito bem! O desenho é simples mas é claro, as cenas de ação são bacanas, a colorização é ok…se eu tivesse que apontar problemas seriam 2. O primeiro é a completa falta de cenários em MUITOS momentos do mangá, com os personagens em pé em fundos coloridos, como se houvessem dois contra-regras carregando lençóis coloridos atrás de todo mundo o tempo todo, e o segundo é…bem….é um quadrinho infanto -juvenil, ele até começa com uma pegada light mostrando que o Pequeno Ninja não mata os bandidos (apenas crava suas estrelas ninja de maneira violenta em partes dos seus corpos), só que de repente a história toma tons sombrios pra caramba…e não só a história, os desenhos também! Parece que alguém esqueceu de pisar no freio em algum momento…

Pequeno Ninja acaba Acidentalmente causando a morte de Ciça, sua namorada.
Sim, essa ainda é uma história infanto-juvenil. Eu acho…

E por falar na história,o roteiro de João Costa é um amontoado de clichês! De religião, com a história de Deus e da origem do diabo contadas com pequenas alterações, , passando por Drácula. indo até plots de filmes de artes marciais B dos anos 80/90 e culminando com plots tirados diretamente de Dragon Ball, a salada acaba funcionando dentro do contexto. Obviamente, se você for um adulto de pouco mais de 30 anos como eu, não vai encontrar nada de novo e torcer o nariz. Agora, imagine que você é um moleque de 10 anos de idade em 2002. A história tem tudo que você quer ver! O único problema que não dá pra ser perdoado como o uso de clichês foi, está no fato do final corrido demais! O vilão da história ganha um poder que o faz reprisar a cena em que o Nappa destrói um exército sozinho em DBZ mas na hora de enfrentar o Pequeno Ninja, que havia ficado “recém poderosinho”, o sujeito é derrotado rápido demais. Se queria seguir a narrativa dos mangás a risca deveria pelo menos estender a luta final por duas edições INTEIRAS! Caramba, o próprio Dragon Ball Z faz isso!

Uma curiosidade bacana de se citar é que a revista ganhou uma sessão de cartas e a molecadinha as vezes escrevia cartinhas dizendo que não tinha tal edição e que gostaria muito de ter mas não podia comprar, como foi o caso do Bruno O. Theodoro que escreveu uma cartinha de cortar o coração publicada na sexta edição onde disse não ter as edições 5 e 6 porque o pai tinha sido mandado embora do emprego e falou que era o grande sonho dele ter as duas edições (crianças tem sonhos tão simples, né!?). Os caras prontamente disseram que iriam cuidar pro sonho do moleque se realizar. Bacana demais!

Cartinha do Bruno

Assim como suas antecessoras noventistas, O Pequeno Ninja Mangá caiu na maldição das 6 edições e foi cancelada. pelo menos fechou a história em um arco completo. O personagem só voltaria as bancas em 2007 pela editora On Line em uma versão que era mais próxima a original dos anos 90 e FINALMENTE quebraria a maldição das 6 edições…sendo cancelada apenas na 10. Um “sucesso”,podemos dizer…acho…

Enfim, O Pequeno Ninja Mangá não era muito original nem em termos de roteiro nem em termos de arte e tinha muitos absurdos dentro de uma história voltada para a molecada…mas foi uma aventura que não ofendeu ninguém. Queria saber por onde anda a galera que trabalhou na revista e saber se seguiram no ramo. Espero que sim e que tenham tido sucesso em seus projetos.

Nota: 7,0

BÔNUS:

A seguir, algumas das páginas mais absurdamente violentas do mangá que ficam hilárias quando você lembra que era uma história pra molecada.