Review/Dica: O Ladrão da Eternidade

Certo dia, Clive Barker, autor de alguns dos mais pesados livros de terror já escritos, pensou “Hmmm…quero escrever um livro infantil!”.

Harvey Swick é um garoto comum, e como todo garoto comum, está morrendo de tédio num fevereiro chato (mês que ele chama sem nenhum carinho de “A Grande Besta Cinzenta”) onde as aulas começaram e as férias acabaram. Porém, as coisas mudam quando, após fechar a janela de seu quarto por onde uma pequena ventania entrara, Harvey encontra um estranho homem com sobretudo, cartola, óculos e um estanho sorriso no rosto que vai, literalmente, de orelha a orelha.

O estranho sujeito se apresenta como Rictus e diz que sabe do enorme tédio e pela necessidade de diversão que Harvey está passando e diz que tem a solução! Um lugar é a resposta! É só Harvey aceitar seguir com ele! Relutante porém entediado demais pra declinar, Harvey aceite e segue Rictus até uma enorme parede no meio da cidade onde não se pode ver o outro lado. Ele a atravessa e acaba se deparando com uma bela casa no meio de um grande campo verdejante. Lá, ele conhece a simpática velhinha , Sra. Griffin, junto de seu inseparável gato azul; conhece também o gorducho e completamente despreocupado Wendell, um garoto de sua idade, além de conhecer Lulu, uma menina melancólica que parece constantemente incomodada com algo. Além deles, Harvey também acaba conhecendo os irmão de Rictus, o tão alto quanto magro Jive, a rotunda e esquisita Marr, ouve falar do quarto irmão, Carna, mas nunca o vê, assim como também não vê o dono da casa, o misterioso Sr. Hood.

A casa tem tudo que uma criança poderia querer! Todo dia é feriado, as noites são sempre Halloween seguidas de Natal, as quatro estações se revesam de acordo com o horário e nada é proibido! Porém, tudo parece bom demais pra ser verdade e Harvey começa a desconfiar seriamente que algo anda muito errado com o lugar. Agora ele vai fazer de tudo pra descobrir qual o segredo daquele local miraculoso e descobrir quem, afinal, é o Sr. Hood.

Lançado originalmente como minissérie em três partes pela IDW em 2005, O Ladrão da Eternidade chegou ao Brasil em 2006 pela Pixel Média (ou, “editora Pixel”, se preferir), nos mesmos moldes gráficos de O Reino dos Malditos e custando tão caro quanto, tendo valor de capa de R$33.00, um valor absurdo pra época.

Assim como Reino dos Malditos, comprei o Ladrão da Eternidade na busca por coisas desconhecidas e baratas por volta de 2015. Não lembro quanto exatamente paguei por ele, mas sei que foi menos de R$15,00. Lembro que, na época, a história não me impactou tanto quanto Reino dos Malditos, já que tinha lido os dois quase em sequência, mas lembro de ter gostado bastante. Nessa releitura que fiz pra escrever esse post, fui levemente surpreendido porque não lembrava a quantidade de elementos que podem ser bem aterrorizantes pra algumas crianças.

A HQ é a adaptação de um livro infantil escrito por Clive Barker. Obviamente não temos o horror gore, depravado, perturbador e assustador tão comum em suas obras para adultos, mas temos uma pegada bem dark em alguns momentos, lembrando muito as animações do Tim Burton como O Estranho Mundo de Jack e A Noiva Cadáver, além de James e o Pêssego Gigante, de Henri Selick (animador dos supracitados longas animados de Tim Burton). Mas não se enganem achando que tais filmes podem ter influenciado Clive Barker! Seu livro saiu em 1992, antes desses três filmes! Sim, Clive Barker não precisa de inspiração na hora de ser bizarro e demente até em obras infantis. Ele consegue isso por méritos próprios!

A adaptação para os quadrinhos ficou a cargo da dupla Kris Oprisko (roteiro) e Gabriel Hernandez (arte). Eu não li o livro (que, creio eu, nunca foi lançado no Brasil) mas devo dizer que a dupla se sai muito bem em seu trabalho. A história é envolvente, os personagens cativantes, alguns odiosos (no bom sentido) e Harvey acaba se mostrando um personagem bem diferente do moleque xarope que você espera no inicio da trama, revelando-se muito astuto e capaz de vencer certos conflitos só com a inteligência. A mensagem sobre aproveitar o tempo que temos, mesmo os tediosos pois sempre há pequenos momentos preciosos nele, é bem bacana e não cai na pieguice.

A arte de Gabriel Hernandez casa perfeitamente com a trama. Ele acerta tanto no visual dos personagens humanos quanto nos “inumanos”, dando aquele ar de personagem de programa infantil com um certo toque de bizarrice. É como ver um episódio de Vila Sésamo mas com você de olho no Elmo o tempo todo pois aquele sorriso sinistro está esquisito nele. As cores tem muito em comum com a usadas em O Reino dos Malditos. Os tons pastéis com uma textura que lembra giz de cera dão a sensação de estarmos vendo ilustrações de um velho livro infantil. E algumas páginas dariam quadros maravilhosos pra se colocar no quarto das crianças! E esperar elas irem dormir na sua cama com medo a noite…

Acho que essa é minha favorita!

Ao contrário de Reino dos Malditos, dos tempos que eu comprei pra cá, O Ladrão da Eternidade parece ter dado uma valorizada. Talvez por ser de Clive Barker. Na Estante Virtual o menor preço é R$27,50 e no Mercado Livre o mais barato é R$20,00. Se você encontrar baratinho, pode pegar que é uma boa leitura. Divertida e com um clima de filme infantil dos anos 80, quando não se tinha muito filtro e algumas coisas mais pesadas entravam no longa sem dar muito problema, O Ladrão da Eternidade é uma daquelas HQs pra se revisitar de tempos em tempos numa tarde chuvosa. Que foi como fiz e é o certo!

Nota: 8,5

PS 1: Como eu disse, esse é um LIVRO INFANTIL USADO EM ESCOLAS AMERICANAS para auxiliar a alfabetizar as crianças. Só que Clive Barker também é artista e foi responsável pela capa da primeira edição do livro! Olha que coisa mimosa pra se por na cabeceira de seus pimpolhos!

E essa é só uma parte da arte que se estende pela contra capa e pelas orelhas do livro. Olha a arte original completinha aí:

Arte bonita? Certamente! Perfeito pra crianças? JAMAIS!

PS 2: Apesar de todo o sucesso da obra e de ser apontado por muitos criticos como “O que Harry Potter deveria ser mas não teve coragem” (e Livros da Magia já era Harry Potter antes de Harry Potter também), O Ladrão da Eternidade jamais ganhou adaptação nem em live action nem em animação. Pelo menos não em longa metragem. Acontece que em um dos relançamentos do livro lá fora, um trailer animado foi produzido e dá uma ideia do que poderia ser um longa animado baseado na obra. Confere:

Bacana! Eu veria uma filme inteiro disso amarradão! P-p-p-por hoje é só, p-p-p-pessoal!