Marvel Teens- Miles Morales: Homem-Aranha.

Uma quase volta aos formatinhos.

Miles Morales é um adolescente de 13 anos que vive no Brooklyn em Nova York com seus pais, os quais o proíbem terminantemente de visitar seu tio, Aaron Davis, mas nunca explicam exatamente os motivos pro garoto. No entanto, essa proibição é sempre burlada por Miles que tem uma ligação muito forte com seu tio. E é em uma dessas visitas que Miles acaba sendo picado por uma misteriosa aranha com o número 42 marcado em suas costas. O incidente serve não apenas para que o pai de Miles tente afastá-lo de uma vez por todas de seu tio como provoca mudanças fisiológicas abruptas no garoto, lhe conferindo incríveis poderes. Ainda sem saber da ligação da aranha com seus novos dons, inicialmente Miles entra em desespero, pois fazendo parte de duas minorias extremamente marginalizadas nos EUA, já que é um negro com descendência latina, acha que agora faz parte de uma terceira minoria marginalizada, a dos mutantes.

Com a ajuda de seu amigo asiático, Ganke, descobre que seus poderes advém da aranha que o picou, assim como aconteceu com o Homem-Aranha. O que Miles não esperava era que o Homem-Aranha fosse morrer pouco depois do incidente que lhe conferiu poderes extraordinários, e menos ainda que a verdadeira identidade do Homem-Aranha fosse a de um garoto apenas 2 anos mais velho que ele e que vivia no Queens chamado Peter Parker. Após uma breve conversa com Gwen Stacy durante o funeral do herói, Miles começa a sentir que seus poderes tem um proposito maior, sobretudo num mundo sem o Homem-Aranha, pois com grandes poderes, vem grandes responsabilidades.

Esse é o resumão básico da origem de uma das melhores e mais ousadas criações da Marvel no século 21, o Homem-Aranha Miles Morales. Porque ousada? Porque era impensável imaginar um substituto pro Cabeça de Teia, mesmo na linha Ultimate. Mas Brian Michael Bendis, o homem dos diálogos GIGANTES, conseguiu trazendo um novo personagem com todo um novo set de problemas da vida real, já que o grande charme do aranha original é justamente ter que ser herói enquanto precisa matar um leão por dia pra sobreviver em sua “vida civil”. E um jovem negro com descendência latina que vive no Brooklyn certamente tem muitos leões pra matar. E é justamente a trajetória desse MUITO JOVEM herói que você vai encontrar na edição da nova série Marvel Teens da Panini intitulada Miles Morales: Homem-Aranha, da qual falarei a partir de agora.

Mas vou dividir por tópicos. Comecemos então:

A História.

Bendis é conhecido por ser um roteirista EXTREMAMENTE textual. Seus personagens mais conversam do que “entram em ação” e isso pode não agradar todo mundo. Quando foi chamado para re-imaginar o Homem-Aranha para toda uma nova geração na linha Ultimate no inicio dos anos 2000, Bendis não mudou seu “modus operandi”, dando um inicio lento a origem do herói. No primeiro arco, composto pelas 7 primeiras edições da revista, o Homem-Aranha só assume sua persona heroica na sexta! Mas o que pode parecer “lentidão” no sentido de “desnecessariamente longo” na verdade quer dizer “lentidão” no sentido de “desenvolver bem os personagens”, e isso Bendis fez muito bem. E com a revista estrelada por Miles Morales ele repete a mesma fórmula e acerta da mesma maneira.

Não vemos um Miles que vê a morte de Peter Parker e já quer virar herói. Primeiro vemos um menino de 13 anos assustado com seus poderes, depois vemos um menino de 13 anos tentando entender e tendo que lidar com a empolgação de seu melhor amigo com relação a seus poderes, e só então vemos um menino de 13 anos tentando ser um herói sem nem saber direito o que está fazendo. Tudo isso enquanto precisa lidar com o relacionamento conflitante entre seu pai e seu tio que sempre acaba o colocando em um local de extremo desconforto por ninguém achar que ele está velho o suficiente para conhecer os motivos de ambos, tem que lidar com uma nova vida em um colégio de elite onde conseguiu uma bolsa e que seus pais enxergam como a oportunidade de sua vida, e ainda tem que lidar com o julgamento das pessoas quanto a esse novo Homem-Aranha rondando pela cidade como se estivesse desrespeitando a memória do herói recém falecido. Bendis conta tudo isso MUITO BEM. O grande problema é que a HQ esbarra em outra mídia e isso pode ser um problema pro novo leitor: O filme Homem-Aranha no Aranhaverso.

Sei que é injusto comparar duas mídias tão distintas, mas o filme fez o trabalho de contar uma origem tão bacana, cativante e cheia de elementos incríveis que quem for correr pra essa HQ esperando ver exatamente o que foi visto lá, pode se decepcionar um bocadinho. No filme, vários elementos novos foram introduzidos, como a relação de “mestre e aprendiz” do velho Peter Parker com o Miles, a relação de Miles com a música, com a cultura hip hop, com a grafitagem e com muitos elementos que o deixam mais rico e interessante; o antagonismo entre o pai e o tio de Miles que agora ganha mais força com o pai de Miles sendo um policial e, finalmente, as inseguranças do garoto em se tornar um Homem-Aranha com tantos “homens-aranha” experientes ao seu redor lhe mostrando que ele ainda tem muito a aprender.

Na HQ, esses elementos não existem. Há outros conflitos interessantes, mas alguns soam meio fora da realidade, como o fato de um menino de 13 anos cujo a altura mal ultrapassa a cintura do pai, tentar se impor como herói.

Em Homem-Aranha no Aranhaverso, se não me engano, Miles tem 15 anos, mesma idade de Peter ao iniciar sua “carreira”, e a picada de aranha o faz crescer um pouco mais, o que justifica ele tomar o lugar do Homem-Aranha e não parecer o “Pré-adolecente-Aranha”. Com 15 anos, muitos de nós já tínhamos mais de 1,80m! No recém lançado jogo para PS5 o personagem parece ainda mais velho, por volta dos 17, se não me engano.

Outro ponto que causa certo incomodo mas tem até uma lógica está no fato de que durante todas as 10 edições que compõem o encadernado, Miles não tem lançadores de teia! Obviamente ele não sabe fabricá-las, pois apesar de muito inteligente, não tem o gênio cientifico de Peter, que na versão Ultimate fabrica apenas os lançadores e as teias ele produz a partir de um projeto abandonado de seu pai para um novo super-adesivo. Na verdade, Miles acha que as teias do Homem-Aranha original eram orgânicas, assim como seus poderes de ficar invisível e dar choque. Então não espere vê-lo se balançado entre os prédios nesse primeiro volume. Ele só vai saltitar de lá pra cá.

Também não espere vê-lo enfrentando um grande vilão principal. Ele tem um rápido arranca rabo com o Electro, que estava pra escapar do Triskleion, a base dos Supremos, mas só! Esse conflito é importante por fazer Nick Fury dar um voto de confiança ao garoto e lhe presentear com seu uniforme negro ( já que ele usava uma fantasia de Halloween HORROROSA até então), mas o primeiro grande vilão da trama ainda não tem um confronto com o herói nesse primeiro volume. Mas ficamos sabendo que acontecerá no próximo e será o Escorpião, em uma versão MUITO diferente da que conhecemos no universo 616 e que inspirou a versão vista rapidamente no final do filme Homem-Aranha: De Volta ao Lar. Se bem que vários elementos do universo do Aranha do Tom Holland são inspirados no núcleo de personagens que aparecem nas histórias do Miles, como Ned Leeds, futuro Duende Macabro, que é basicamente o Ganke no filme.

Os Desenhos

Temos 3 desenhistas nessa edição, Sarah Pichelli, Chris Samnee e David Marquez. Na minha opinião, Sarah Pichelli é A desenhista do Homem-Aranha Miles Morales. Claro que os 3 desenhistas são ótimos, inclusive com o Samnee sendo celebrado por muitos pela sua passagem no Demolidor do Mark Waid, mas eu AMO o traço da Sarah Pichelli. David Marquez faz um ótimo trabalho também é consegue andar em maior consonância com o trabalho de Pichelli. Em resumo, não há do que se reclamar com relação aos desenhos ou a narrativa aqui!

A Edição da Panini

A Panini tem buscado uma nova leva de leitores e pra isso tem mirado também no publico mais jovem. Para tanto, lançou a linha DC Kids e DC Teen e Marvel Teens. Na linha DC Kids as histórias são, obviamente, voltadas para o publico infantil, com um traço e tramas bem mais simples. Na linha DC Teen as histórias são focadas em reimaginações adolescentes de alguns personagens e suas origens. Dei uma olhada por alto em algumas edições e, pra mim, soaram mais como “fanfics oficializadas” com carinha de “mamãe, quero ser um mangá”, sendo a pior de todas Batman: Criaturas da Noite, que se foca na adolescência de Bruce Wayne e é entupido de momentos “Olha o que ele está fazendo/falando/vestindo aqui! Isso é uma pista de que ele vai ser o Batman no futuro!” coisa que eu simplesmente DETESTO! Eu não preciso ser lembrando que Bruce Wayne vai se tornar o Batman, eu SEI que ele vai ser o Batman! Já não basta o fato de, sem motivo nenhum, ele usar uma logo em seu uniforme quando seu trabalho deveria ser passar o mais desapercebido possível? Aliás, nunca entendi esse lance de heróis usarem logos no uniforme…mas segue o bonde.

Imagem de Batman: Criatura da Noite e um dos muitos momentos “OLHA, ELE VAI SER O BATMAN NO FUTURO, OLHA!”

Já na linha Marvel Teens, a decisão foi mais acertada. Pegar histórias e arcos de personagens adolescentes consagrados da editora e encadernar (com excessão do recente “Homem-Aranha Ama Mary Jane” que sofre do mesmo mal de “mamãe, quero ser mangá” da DC Teen e é mais um shoujo com o aranha como coadjuvante da Mary Jane. Mas pelo menos é desenhado por um japonês de verdade…). Quando foi anunciado o lançamento da edição focada no Miles, eu fiquei empolgadaço, sobretudo por ser anunciado que compilaria 10 edições ao invés das 5 que compõem o primeiro arco e que foram publicadas na coleção da Salvat de capa preta. Me empolguei mais ainda por ser capa cartão e custar R$34,90, um preço até razoável pra um encadernado compilando 10 edições, sobretudo hoje em dia, onde tudo tá caro pra porra! Só que aí vem a surpresa: o formato!

O encadernado tem 15 x 22, bem menor que um formato americano e pouco maior que um formatinho. Basicamente, é do tamanho médio de um livro (sim, eu sei que livros também variam de tamanho, mas vocês me entenderam). Esse tamanho me incomoda? Não! Sei que vai incomodar muita gente, mas a mim não incomoda, já que a impressão está muito boa e o formato é bacana pra você levar pra onde quiser. O que me incomoda é que o tamanho não justifica o preço! Se vai custar R$34,90, ENTÃO ME PUBLICA EM FORMATO AMERICANO, CACETA!

Outra coisa que não condiz com o preço é a capa. Um papel cartão simples, sem aplicação de verniz nem nada do tipo. Na verdade, a impressão da capa é tão vagabunda que vem manchadinha e dá a impressão de que ela tá suja. A Panini vai precisar melhorar MUITO esse aspecto pros próximos volumes (que eu espero que venha, já que quero ler essa fase inteira).

A qualidade da câmera do meu celular não é das melhores, mas dá pra notar as manchas na perna do Miles, né? É assim, com esse aspecto de coisa velha, na capa toda.

Ah, de positivo vale destacar que a Panini pegou as páginas da primeira edição onde o personagem aparecia, chamada Ultimate Fallout 4, que foi uma mini-séria mostrando a repercussão da morte do aranha pra vários personagens do universo Ultimate, e inseriu cronologicamente dentro do encadernado, o que deixou a história muito mais fluída e bacana. Nem só de vacilo vive a Panini.

ESSE PERSONAGEM NÃO É AQUELE OUTRO NO FILME…?

A primeira e ultima vez que li o Homem-Aranha do Miles Morales foi quando ele apareceu pela primeira vez na revista Ultimate Marvel 27 da Panini em 2012 e li até a edição 31, que correspondia a edição 4 da revista do Miles. Depois disso, nunca mais tinha lido ou re-lido nada com o personagem, então ler esse encadernado foi quase como se estivesse lendo pela primeira vez, já que lembrava de pouquíssima coisa. E foi justamente por isso que fui percebendo coisas que o filme Homem-Aranha no Aranhaverso apresentou e eu tinha como certas, mas que não eram. A mais gritanteé que existem 3 personagens na trama do filme que foram completamente adaptados de personagens diferentes dos quadrinhos. INCLUSIVE O PRÓPRIO MILES!

No filme, todos conhecemos Miles como um jovem negro com um cabelo afro estiloso e que vive com seus fones de ouvido pendurados no pescoço, dado seu amor a música. Acontece que nos quadrinhos, esse visual pertence ao personagem Judge, o colega de quarto de Miles e Ganke no colégio de elite onde estudam.

Em compensação, a o Ganke do filme é um cara que mal interage com Miles, sendo mais caladão e também sempre com fones de ouvido, seja pra escutar musica, pra jogar e até pra ler, além de usar óculos, coisa que o Ganke da HQ não faz. A personalidade e os óculos do personagem também foram herdadas de Judge.

O pai do Miles NÃO É POLICIAL na HQ. Na verdade, seu passado foi exatamente do lado oposto da lei, por isso ele se preocupa tanto em manter Miles longe de más influências, pra não cometer os mesmos erros. O pai do Miles no filme é baseado no capitão Frank Quaid da policia de Nova York que já havia ajudado Peter Parker anteriormente e, por isso, evitar tentar prender Miles e lhe dá alguns conselhos tentando convencê-lo a desistir por ser só uma criança.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar do preço salgadinho pra o formato diferente (ainda acho que deveria custas uns R$26,90), essa primeira edição é uma ótima pedida pra quem quer conhecer o personagem ou pra quem já conhece e quer reler a trama em um encadernado. Dos títulos voltados pra molecada da Panini esse é o único que tem uma pegada que a galera mais velha vai curtir com toda certeza, afinal Homem-Aranha é Homem-Aranha, sempre tocando em questões sociais importantes e com questionamentos relevantes pro personagem. Esperem uma promoçãozinha e vão sem medo.

Nota; 8,5