Encarcerados

Como começar a gostar de romances policiais? Leia-os disfarçados de outra coisa.

Em algum ponto de um futuro sugestivamente próximo, o mundo foi vítima de uma doença desconhecida  que foi batizada como Síndrome de Haden, graças à Margareth Haden, à época primeira dama dos Estados Unidos e vítima mais notória da doença que no seu auge matou mais de 400 milhões de pessoas pelo globo. A Síndrome tem por início sintomas de um resfriado comum que logo progride para um quadro muito semelhante a uma meningite. Apesar do alto índice de mortalidade entre os acometidos por haden, uma parcela considerável dos infectados sobrevive, não sem sequelas.

A maioria que sobrevive ao quadro de meningite se vê preso dentro do próprio corpo para sempre, impossibilitado de interagir sozinho com o mundo externo. A alternativa encontrada foi a criação de uma rede neural implantada cirurgicamente nessas pessoas, que passaram a se encontrar em um espaço virtual conhecido como Ágora, além do uso de corpos robóticos chamados transportes pessoais, mas apelidados carinhosamente de C3, referência direta ao icônico androide de Star Wars.

Outros sobreviventes ficaram sem sequelas físicas, porém as modificações cerebrais causadas pela haden os tornaram capazes de compartilhar os seus corpos com os que foram encarcerados através de uma rede neural também. Essas pessoas são conhecidas como integradores e são muito requisitados, visto que não passam de umas quatro dezenas de milhar no mundo todo. Um contrato entre um haden e um integrador possui uma série de cláusulas, sendo a de confidencialidade a mais importante.

Contextualização feita, vamos ao enredo, que acompanha Chris Shane, antiga criança propaganda para pesquisas pró hadens em seu primeiro dia como agente do FBI. Logo de cara um problema sério a se resolver: uma cena de briga, um corpo degolado estendido no  chão e um homem ensanguentado, sem a mínima ideia do que está acontecendo. A identidade do falecido é uma incógnita, e o provável assassino é um integrador. Como nada é tão complicado que não possa piorar adicione intriga  política, espionagem industrial e robôs em cadeiras de rodas. Boa leitura.

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Nunca julgue um livro pela capa, mas nesse caso pode julgar sim, pois além de alardear que Encarcerados é dos mesmo autor da série Guerra do Velho, uma das melhores ficções científicas que eu já li, a arte de Josan Gonzalez (que também ilustra as capas da Trilogia Spraw da Aleph) é um belo chamariz para compra. Em Encarcerados temos os mesmos elementos de Guerra do Velho como a leveza de escrita, o bom humor, ação simples e empolgante, história bem contada que não subestima o leitor e baldes de acidez e crítica, elemento presente em muitos baluartes da ficção. Mas aqui o humor é um pouco menos escrachado, como uma piada boa ouvida quando você está de ressaca.

Mesmo com o verniz de ficção científica, com doença misteriosa, ciberespaço, transmissão de consciência e androides caminhando para todos os lados, esse livro é em essência um livro policial, o que não é demérito nenhum, muito pelo contrário. A história é apresentada, se desenrola até um clímax na medida certa e tem um desfecho que te deixa bastante satisfeito com a leitura. Pelo que deu pra levantar, esse é apenas um livro de uma série, porém pode ser lido sem preocupações pois a história fecha aqui mesmo, o que é ótimo, visto que hoje em dia tudo é trilogia.

Atualmente o livro se encontra nas livrarias on line custando em torno de 30 reais, que pra um livro muito bem escrito e com 323de  história é um preço até que justo. Recomendo muito para os que não conhecem o trabalho do Scalzi, para os que já conhecem e querem presentear alguém com um bom livro. Esse livro é uma boa aprentação ao autor, melhor do que assustar a pessoa com uma trilogia (fãs de Tolkien, não recomendem Senhor dos Anéis de cara pra quem não conhece, isso é vacilo).

Godoka
09/09/2019