Demolidor: Eco

Ou “Parte do Todo”, que foi como eu li.

Eu tenho 3 sagas do Demolidor que são as minhas favoritas: O Homem Sem Medo do Frank Miller com o Romitinha, A Queda de Murdock do Frank Miller com o David Mazzucchelli e Diabo da Guarda do Kevin Smith com o Joe Quesada. A Queda de Murdock e Diabo da Guarda eu li MUUUUUITOS anos antes de O Homem Sem Medo porque A Queda de Mudock foi republicada em 1999 pela Abril, dois anos depois de me tornar leitor regular de quadrinhos de super-heróis, e Diabo da Guarda começou a ser publicado em Marvel 2000 da Abril, ultima vez que veríamos essa linha em banca (pela Abril, pelo menos) que havia começado com Marvel 97 e a única que não chegou a edição 12, deixando o ano de 2000 incompleto. Isso porque a Abril “matou” seus formatinhos pra começar a mal fadada linha “premium”, que trazia mixes em formato americano, capa cartonada e custavam absurdos (pra época) R$9,90.

Pra minha alegria, essa mudança não afetou Diabo da Guarda que acabou sendo publicada na integra na Marvel 2000, terminando na penultima edição da revista, a Nº06. E aquele arco me pegou não apenas pelo ótimo roteiro de Kevin Smith mas também pela arte de joe Quesada, pela qual me apaixonei perdidamente. Infelizmente com a mudança pra linha Premium não pude seguir lendo as aventuras do Demolidor na nova e remodelada Grandes Heróis Marvel, pois o salto de R$2,50 pra R$9,90 estourava meu orçamento de adolescente pobretão. E foi justamente por isso que não li o arco “Partes do Todo” que introduzia a personagem Eco. Mas acabei descobrindo que quem seguiu acompanhado o personagem na Abril teve um problema com esse arco! Acontece que o arco atrasou lá fora. A edição 13 da revista do Demolidor saiu em outubro de 2000 e a 14 só saiu em março de 2001! Então a Abril publicou até a edição 13, que correspondia a parte 5 da saga, colocou o personagem em modo de espera mas como deixou de publicar Marvel e DC em 2001, os leitores só veriam as duas ultimas partes do arco na revista Marvel 2002, agora pela Panini.

Bem, como eu disse, não conhecia a personagem exatamente por isso, mas ouvia falar por alto em uma ou outra revista ou site informativo. Então a personagem apareceu na série do Gavião Arqueiro. Apesar de ter adorado a série, a personagem não me chamou lá muito a atenção. Então anunciaram que ela ganharia série própria e continuei não ligando (assim como muita gente), mas disseram que teria o Demolidor e o Rei do Crime e então a série passou a ter minha atenção (assim como a de muita gente). A Panini aproveitou o…errr…”hype” da personagem na série do Gavião Arqueiro pra lançar um encadernado dedicado a ela reunindo seu dois arcos publicados na revista do Demolidor e então resolvi ler pra saber mais das origens da persongem nos quadrinhos. Então IGNOREI COMPLETAMENTE O ENCADERNADO DA PANINI PORQUE SOU UM FODIDO E TÁ CARO PRA PORRA (R$104,90), baixei os scans tirados das edições da Abril e da Panini, li e cá estão minhas impressões. Mas, antes, a sinopse:

Após a trágica morte de Karen Page, Matt Murdock decide que é hora de juntar os cacos e retomar a vida. Ele reconstroi o prédio da Nelson e Murdock e antes mesmo de começar os trabalhos, a dupla de advogados recebe a visita de um homem com um sério problema de dicção dizendo ser ex-funcionário de Wilson Fisk e que tem uma denuncia grave que pode por o Rei do Crime na cadeia. Porém, quando ia fazer a tal revelação bombástica, o homem é morto por um tiro de sniper que acaba atingindo Matt no rosto também. Ainda atordoado, Matt põe o uniforme do demônio e consegue capturar o assassino. Ou melhor, OS ASSASSINOS, já que eram gêmeos.

Depois disso, Matt é levado ao hospital pra tratar do ferimento no rosto. Ainda com os sentidos sobrecarregados, ele sente o cheiro do homem que morreu em seu escritório e ouve sua voz com dicção problemática dizer “O segredo é o Cavalo Louco”. Ainda sem entender como um homem morto pode ter vindo até ele lhe dar tal informação, Matt começa uma investigação e acaba por descobrir que “Cavalo Louco” é a senha pra um cofre secreto onde o Rei do Crime guarda material de chantagem contra politicos e pessoas influentes. Ele vai até o tal cofre na torre Fisk, pega os documentos e está pronto pra levar Wilson Fisk a justiça. Afim de tentar impedir que isso aconteça, o Rei do Crime pede para a sua protegida, a jovem surda e muda Maya Lopez, que vá até os escritórios de Nelson e Murdock e tente dizer que ele é inocente. Claro que isso não passa de um ardil do vilão. Acontece que Maya e Matt acabam criando uma conexão e se apaixonam. Se aproveitando disso, o Rei do Crime mente e diz a Maya que o Demolidor matou seu pai e mostra uma foto do herói segurando a arma usada no crime. A verdade é que Wilson Fisk matou o pai de Maya, que era conhecido como Cavalo Louco, com a própria arma, a qual guardava no seu “cofre das chantagens” e a foto onde o Demolidor aparece segurando a tal arma foi tirada no momento em que ele pegou as provas no cofre de Wilson Fisk.

Agora, com sede de vingança, Maya passa a usar seu peculiar talento pra se tornar uma combatente melhor que o Demolidor afim de matá-lo. Acontece que por não ouvir, Maya passou a observar e absorver informação a ponto de mimetizar ações e comportamentos, algo muito parecido com o que o Treinador faz. Pra levar a cabo sua vingança ela passa a se exercitar, assistir filmes de artes marciais e assistir uma fita onde o Demolidor e o Mercenário se enfrentaram em um estúdio de TV. Agora ela buscará vingança contra o homem que acredita ter matado seu pai enquanto está alheia ao fato de que ele também é o homem que ama.

Eu já devo começar dizendo que a história, escrita por David Mack, não é um primor de originalidade e ter se seguido a um arco tão marcante (pelo menos pra mim) como Diabo da Guarda, que tinha os ótimos diálogos escritos por Kevin Smith, não ajuda em nada. Muitos momentos soam bobos e forçados e os momentos mais dramáticos carecem de força. O próprio plot do “eu amo o homem mas odeio o herói e não sei que os dois são a mesma pessoa” é algo reciclado a exaustão e aqui parece que temos uma Elektra requentada mas com aquele gostinho estranho de feijão que ficou tempo demais na geladeira. A habilidade da Maya não é algo original, como eu já disse, mas consegue ser interessante. O que é estranho e destoante é como ela vai de uma menina surda-muda que é uma flor de pessoa, que enxerga a beleza das pequenas coisas, que ama a arte e a dança pra uma pessoa com sede de vingança e fome de violência sem nunca ter sequer cogitado fazer mal a uma mosca antes. E, apesar de absurdo, isso TAMBÉM é um clichê.

Acredite, eu não tenho NADA contra clichês! Se os clichês não existissem, não teríamos várias ótimas obras cinematográficas, literarias e musicais! A questão é saber trabalhar o clichê e, honestamente, eu creio que David Mack capengou aqui com um roteiro que oscila e muitas veze se arrasta por caminhas que não queriamos trilhar. Isso se manifesta em dois casos. O primeiro é o foco em Wilson Fisk e seu passado. David Mack tenta dar um destaque na trama ao personagem mas parece repetir uma história que a gente já ouviu. A infância do Rei do Crime já foi explorada em muitas outras histórias mas Mack insiste em revisita-lo quando poderia mostrar o passado do Rei com o pai de Maya e nos fazer entender a relação de amizade e o que levou Wilson Fisk a matar alguém a quem ele considerava seu melhor amigo. Isso fica completamente jogado e não sei se foi explorado no arco focado na personagem que teria inicio na edição 51 americana do Demolidor e que também está no encadernado da Panini mas que eu, sinceramente, não sinto vontade de ler. Mas NESSA história é onde ela deveria estar, e…não está!

O segundo caso é na parte quatro intitulado “Brincando com Armas” ( “Às Armas” na edição da Panini), onde Joe Quesada é substituído por Rob Haynes nos desenhos. O traço é bem destoante do todo mas isso não incomoda. O que incomoda é que essa história se foca em como a luta do Demolidor conta Eco influencia na vida de pessoas que estão ali perto, completamente alheias a ambos. Uma antena de TV quebrada que mantinha o sinal na casa de um casal que estava tendo problemas acaba fazendo um ladrão tropeçar e cair em cima do carro de um cara que estava pra se matar e blá,blá,blá. Essa história soa como aqueles episódios de recheio em uma série que não fariam a menor diferença pra trama se fossem cortados, como o infame episódio da mosca em Breaking Bad ou, pra citar algo mais recente, o episódio do casamento em Mulher-Hulk.

“Esta é Brenda. Você com certeza não está interessado na história dela. Mas nos vamos contar mesmo assim!

Os flashbacks do Rei do Crime acabam tomando grande parte da edição que conclui a saga e mina DEMAIS o impacto da luta final entre Demolidor e Eco. E a trama meio chocha caminha pra um climax igualmente xoxo e meio “sério mesmo que tu tá fazendo isso, David Mack…?” com o Rei do Crime sendo colocado em uma situação que deveria ser permanente mas que a gente sabe que NUNCA seria. Isso sem contar pra explicação completamente IDIOTA de tão forçada pro Matt ter ouvido e sentido cheiro de uma pessoa que deveria estar morta quando estava no hospital. A “Assossiação de Conveniências de Roteiro” daria um prêmio ao David Mack se ela existisse!

Na arte, além de Joe Quesada, temos o supracitado Rob Haynes, que tem um traço mais limpo e parecido com o de uma animação, e David Ross, que tenta emular o traço de Joe Quesada em alguns momentos mas não se sai lá muito bem. Ele não é ruim, longe disso! Mas sempre me incomoda quando um desenhista tenta emular outro pra tentar “não incomodar” o leitor. Prefiro que usem os próprios estilos, por mais diferentes que sejam, mas que mantenham a identidade.

Joe Quesada está bem mas as vezes parece estar meio apressado, fazendo algo bem mais desleixado do que fez em Diabo da Garda. Talvez o cargo de editor-chefe estivesse tomando muito de seu tempo na época. Em muitos momentos a Maya aparece com olhos exageradamente enormes e as vez até mesmo tortos, e em um momento ele exagera tanto na musculatura da moça que fica parecendo uma cena de super sentair (grupos de super heróis japoneses como os Changeman, por mais velhos, e Power Rangers, pros mais novos) ondem colocam um dublê masculino pra fazer a personagem feminina transformada e você nota que a moça, que era magrinha, de repente ganhou ombros ultra largos.

No geral, Eco é uma história mediana do Demolidor. Não tem grandes momento e não é algo realmente memorável e não creio que figure na lista de favoritas de muita gente (não escrevo “de ninguém” porque gosto é muito subjetivo e tenho certeza de que existem pessoas que adorem o arco, e tá tudo bem). Se eu pagaria os R$104,90 que a Panini está cobrando? JAMAIS! Enquanto escrevo esse post o encadernado caiu pra R$ 79,30 na Amazon mas eu ainda acho carinho. Se ficou curioso e sente e necessidade de ter a edição fisica, espere um precinho mais camarada. Se nunca leu nem Eco nem Diabo da Guarda, dê preferência a Diabo da Guarda, já saiu em vários formatos encadernados e você pode encontrar por preços a partir de R$25,00 (ou até menos se tiver uma banca com encalhes da Salvat em sua cidade). Mas, pra Eco, eu dou…

NOTA: 6,5